Já se Perguntou Sobre a Sua Existência?

23/06/2020 19:13

Andreia Gomes Araújo,
Bolsista PET-Letras
Letras – Português

Você já deve ter feito algumas perguntas, tais como: Quem somos? De onde viemos? Para onde vamos? Há um Deus ou vários deuses? Se sim, com o que se pareceria(m)? Será que essa aparência tem alguma semelhança com aquelas criadas pelo homem, as quais podem ser facilmente encontradas em templos, igrejas, santuários, terreiros etc. de diversas religiões e credos? Na verdade, quem nunca se questionou sobre os mistérios que nos cercam, não é mesmo?

Fonte: Foto de Deborah Ory/Ken Browar (https://portaldocurta.wordpress.com/)*

Entretanto, podemos encontrar muitos que imaginam que esse tipo de questionamento não passa de um conjunto de perguntas inúteis que não nos levam a nada. Pode até ser que tenham alguma razão, mas como saberemos se essas perguntas não são de fato importantes? E qual seria a motivação para deixarmos de fazê-las? Entendo que essas perguntas nos possibilitam pensar sobre a nossa existência e, inclusive, a dar sentidos a ela.

A compreensão de nossa existência é algo que nos instiga. Perguntar-se sobre sua realidade, sobre si mesmo, é uma forma de estar no mundo, é um modo de buscar motivações e possibilidades para o viver. É por meio de perguntas que iniciamos nossas buscas e reflexões em direção a descoberta diária do novo. É nessa constante procura que as coisas começam a se encaixar; é que as peças vão formando o quebra-cabeça de nossa vida.

Curiosamente, tenho buscado informações sobre a realidade na física quântica, já que a religião que eu conhecia não me deu as respostas que eu queria. Agora, estou explorando outras possibilidades de explicação e compreensão da realidade e sinto que estou no caminho certo. Existe um livro, cujo título é “O universo autoconsciente”, do físico quântico Amit Goswami (referência mundial em estudos que buscam conciliar ciência e espiritualidade), que pode até ser visto por alguns como mero livro de autoajuda, mas, que tem o propósito de apresentar algumas descobertas da física quântica em relação à compreensão da realidade e às crenças das quais, muitas vezes, fazemos parte. Sugiro a leitura, pois vale muito a pena.

Fonte: Site sincronicidade mágica: você é o que  sincroniza**

Além de compartilhar essas descobertas da física quântica, Goswami menciona a religião, dizendo que “[…] em todas as grandes religiões existem tendências dualistas. Na maioria delas, ocorre o endeusamento de um dado mestre ou a promulgação de um dado sistema de ensinamentos ou crenças. No cômputo final, estes têm que ser transcendidos. Dessa maneira, no estágio final de desenvolvimento, o esquema idealista deve transcender todas as religiões, credos, sistemas de crenças, e mestres” (1998, p. 310). Interessante a visão que ele apresenta, não é mesmo? Então, se ficou curioso indico que o leia, pois não vou dar spoiler.

Por fim, há um documentário também muito interessante, do qual, inclusive, o Amit participa como entrevistado: “Quem somos nós”. Como são feitas muitas críticas a esse documentário, ele se torna ainda mais interessante. O documentário mexe com certas estruturas tradicionais do sistema social e, por sua vez, vai de encontro a muitas crenças que nos foram socialmente ensinadas. Então, se você já se fez e ainda se faz muitas perguntas sobre o que é e como funciona nossa realidade e, consequentemente, está em sua busca por respostas, deixo essas duas boas sugestões: o livro “O universo autoconsciente” e o documentário “Quem somos nós”.

Referência:

GOSWAMI, Amit; REED Richard E.; GOSWAMI, Maggie. O universo Autoconsciente: como a consciência cria o mundo material. Tradução de Ruy Jungmann. 2. ed. Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos, 1998.

*fotodescrição: Na imagem um homem suspenso no ar em posição frontal, sua cabeça está levemente inclinada para a sua esquerda, assim com sua mão esquerda (como se estivesse dando a mão para alguém), está com semblante de paz e olhos fechados. O homem, branco de cabelos lisos e escuros, veste uma cueca tipo boxer branca. Sua musculatura é sarada.  A imagem está em preto e branco.

**fotodescrição: É uma imagem do livro “O universo autoconsciente”, a cor predominante é azul marinho, bem escuro, quase preto. Na parte superior, mais para esquerda, uma cabeça, que mostra mais o rosto (virada para baixo) de um humano, não dá para saber se é homem ou mulher, apesar de se aproximar da imagem de um homem. Não dá para saber direito porque onde seria o cabelo tem flechas de luz. Este rosto está em cor branca luminosa que transcende a cabeça. O livro está levemente inclinado para sua direita. Na parte inferior esquerda, de cima para baixo, está escrito: “O universo autoconsciente: como a consciência cria o mundo material”, depois estão os nomes dos autores: “Amit Goswami (autor do best seller a física da alma) com Richard E. Reed e Maggie Goswami”. Na lateral de baixo para cima temos o símbolo da editora e o título “Universo autoconsciente” e o nome do físico Amit Goswami.

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As artes marciais e a formação do humano: uma aproximação

22/06/2020 17:05

Felipe Mateus dos Santos,
Bolsista PET – Letras
Letras – Português

A história das artes marciais indica que elas começaram a aparecer na sociedade a partir do desenvolvimento das civilizações e de suas necessidades de acumular e proteger riquezas, territórios e poder. Entretanto, sua origem é incerta, pois não existem muitos registros históricos que nos permitam atestar tal surgimento. Portanto, muitas teorias, inclusive dúvidas, a respeito desses primórdios das artes marciais são propostas. Uma teoria oriental, por exemplo, considera que um monge indiano, chamado Bodhidharma, teria saído da Índia no século VI e ido para a China, chegando a um mosteiro onde ensinou yoga e uma forma de luta rudimentar indiana, que mais tarde constituiria a luta shaolin e se espalharia por toda a China e, posteriormente, por toda Ásia. Por outro lado, há relatos de arqueólogos que descobriram a existência do kung fu há mais de 5.000 anos. 

A origem do termo “artes marciais” também gera algumas interpretações diversas, mas a mais difundida é aquela baseada em uma teoria latina ocidental, a qual faz menção ao deus da guerra, Marte. Na mitologia greco-romana, Marte era aquele que ensinava a arte da guerra aos homens. Já no oriente, alguns termos mais específicos são utilizados para se referir às artes marciais, como Wu Shu, na China, e Bu-Shi-Do, no Japão, os quais podem se referir às artes de guerra ou ao “Caminho do Guerreiro”. Hoje em dia, esses termos são utilizado por todos os sistemas de combate — seja oriental ou ocidental — e com ou sem o uso de armas tradicionais.

Ainda que se atribua as origens das artes marciais às necessidade de manutenção de poder e bens, é possível perceber que a sua prática dentro de um dojô (local do caminho, ou seja, local onde são praticadas as artes marciais) apresenta uma estrutura notadamente nobre. A principal característica da arte marcial seria a defesa pessoal em uma situação de risco, porém, no dia a dia dos treinamentos, considera-se necessário que diferentes aspectos do nosso corpo, da nossa mente e do nosso espírito sejam devidamente trabalhados, para que as artes marciais sirvam ao seu propósito, sendo utilizadas da forma mais justa possível.

Duas grandes áreas do Taekwondo — uma das artes marciais coreanas mais antigas, a qual pratico atualmente — são boas evidências de que a arte marcial pode contribuir para a formação de valores éticos e morais, tais como responsabilidade, respeito e autonomia. Na primeira área do Taekwondo, podemos observar que ele se pauta em cinco princípios básicos, que orientam o caminho de quem o pratica, a saber: Cortesia, Integridade, Perseverança, Autocontrole e Espírito Indomável.  Esses princípios são constantemente relembrados, repetidos e cobrados durante os treinamentos para que o artista marcial tenha sempre em mente os valores aos quais deve se orientar não só na luta, mas também em sua vida. A segunda área dessa arte, de maneira geral, é a sequência de faixas (Kup), que orientam o caminho do praticante, que são elas:

  • Primeira faixa: Branca – Representa a inocência, o artista iniciante que não possui nenhum conhecimento sobre a arte.
  • Segunda faixa: Amarela – Significa a Terra, a qual uma planta brota e começa a germinar, ao passo que o alicerce vai sendo construído.
  • Terceira faixa: Verde – Significa o crescimento da planta, representando o desenvolvimento das habilidades na arte.
  • Quarta faixa: Azul – Representa o céu, através do qual a planta cresce até se tornar uma grande árvore frondosa, enquanto as habilidades na arte progridem.
  • Quinta faixa: Vermelha – Significa o perigo, advertindo o lutador a exercitar o autocontrole e advertindo o adversário a se manter longe.
  • Sexta faixa: Preta – Representa a maturidade e habilidade na arte, indicando também a imunidade ao medo e ao obscuro.

Fonte: Arquivo Pessoal (Imagem de uma cerimônia de troca de faixa)*

Cada faixa é carregada de um significado e de um Tul, que é uma sequência de movimentos que simula um combate com adversários imaginários em diversos ângulos e posições, cada Tul representa um dos personagens históricos ou momentos relativos aos eventos da história coreana.

Com isso, vemos como o caminho que o artista marcial percorre dentro da arte marcial, juntamente com os valores que são trabalhados pelos mestres e professores, tem uma extrema importância para a formação e desenvolvimento do caráter no ser-humano, contribuindo com sua construção de valores morais, que são sempre exigidos na vida em sociedade, e para que ele se lembre da sua história e da história dos seus antepassados. Portanto, assim como é considerado no Japão como Bu-Dô, as artes marciais são vistas como “um caminho educacional através das lutas”.

*Foto descrição: Imagem com um fundo de uma parede branca e uma janela de vidro aberta. Em primeiro plano, sobre um tatame com as folhas intercaladas nas cores azul e laranja, está Felipe em pé à esquerda, de cabelo curto, recém cortado, vestindo um dobok (uma vestimenta branca de pano leve, com a parte de cima de manga longa e uma abertura na frente, e a parte de baixo uma calça confortável). Ele tem os braços levemente abertos e a cabeça baixa, olhando em direção à cintura, enquanto uma menina, de cabelos longos, cacheados e presos em rabo de cavalo, também de dobok e faixa verde amarrada na cintura, amarra uma faixa na cor azul na cintura de Felipe. Mais à direita está um homem branco, de cabelo curto e dobok com listras pretas nas extremidades, uma faixa preta na cintura e segurando uma faixa verde na mão, acompanhando sorridente o momento da troca de faixa.

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“The first pride was a riot”: em tributo a Stonewall e ao mês do orgulho LGBT

18/06/2020 19:14

Ananda Henn,
Bolsista do PET-Letras
Letras – Português

Se você usa redes sociais, é provável que esse mês tenha visto rolando bastante por aí o termo “pride month”. Talvez tenha aparecido para você em threads de recomendações de filmes no Twitter, ou quem sabe até em e-mails de promoções de lojas virtuais. Aqueles que sabem que no dia 28 de junho é celebrado o dia internacional do orgulho LGBT — e que em sua homenagem ocorre a famosa “parada gay”, ou melhor, a parada do orgulho LGBT — podem ter chegado automaticamente a conclusão de que no Brasil, assim como em outros países, junho é celebrado como o pride month, ou “mês do orgulho”, para a comunidade LGBT. Mas afinal, você sabe por que dia 28 de Junho? Uma palavra: Stonewall.

Fonte: Montagem feita pela autora a partir de imagens retiradas da internet.*

Quem já pesquisou sobre a história dos movimentos LGBT por direitos, inevitavelmente, deve ter esbarrado em algum momento com os protestos de Stonewall, mas mesmo dentro da comunidade poucos realmente conhecem o que aconteceu naquele junho de 1969 e o porquê de ter sido tão significativo. Para isso, é preciso entender um pouco do contexto histórico daquelas manifestações.

Como exposto por Carter (2004) no livro Stonewall: the riots that sparked the gay revolution, em grandes metrópoles como Nova York, bairros como Greenwich Village se tornaram no pós-guerra o lar de um grande número de homossexuais; eram poucos os estabelecimentos, porém, onde membros da comunidade pudessem se reunir abertamente. Os “bares gays”, portanto, ocupavam um espaço central da comunidade, mas devido a uma regra da New York State Liquor Authority (em português, Autoridade de Bebidas do Estado de Nova York), a presença de um “homossexual conhecido” em um estabelecimento com licença para venda de álcool por si só tornaria o local “desordenado” e passível de ter a licença revogada. Assim, quem assumiu o controle de bares gays foi ninguém menos que a máfia, que pagava aos policiais para evitarem ataques frequentes aos bares e, em compensação, garantirem para si muito lucro ao vender bebidas superfaturadas misturadas com água, além da cobrança da taxa de ingresso aos estabelecimentos.

Um desses bares era o Stonewall Inn, localizado na Christopher Street do Greenwich Village e controlado pela Família Genovese. Era um dos bares mais populares por ser barato e o único bar para homens gays na cidade onde era permitido dançar — um grande atrativo. Muito frequentado por “street kids”, jovens homossexuais moradores de rua, e por drag queens, sua clientela era bastante diversa entre brancos, negros e hispânicos, sendo a maioria gay, e, também, contava com significativa presença de lésbicas.

As invasões da polícia costumavam ocorrer cedo e em noites da semana, momentos de menor movimentação do bar, e os funcionários geralmente eram avisados com antecedência pelos seus contatos na polícia para que a bebida pudesse ser escondida (o estabelecimento não tinha licença para vender álcool). Na madrugada de um sábado de 28 de junho de 1969 não foi assim que aconteceu. Pressionado a “limpar a cidade” em busca da re-eleição em Novembro, o prefeito de Nova York incentivou a polícia a aumentar as invasões nos bares gays. Naquela noite, o bar lotado foi invadido e, para alguns, era a primeira vez que presenciavam a ação policial. O procedimento padrão era conferir as identidades dos clientes e fazer com que as policiais do sexo feminino levassem aqueles vestidos como mulheres para o banheiro para verificar seu sexo, sendo que qualquer pessoa fazendo cross-dressing seria presa (era obrigatório por lei o uso de ao menos três itens de vestimenta “apropriados ao próprio sexo”).

Por algum motivo, ao invés de aceitar com resignação, a população revidou. Ninguém sabe ao certo como tudo começou — as pessoas que conseguiram sair do bar não foram embora, como de costume, mas se juntaram na frente do prédio; alguns clientes se recusaram a mostrar suas identidades; drag queens se recusaram a terem seu sexo confirmado; os selecionados para serem levados para delegacia se recusaram a entrar no comboio policial. Logo, segundo consta nos registros, a sensação era de revolta e indignação e, com o número de homossexuais do bar e da vizinhança, atraídos pela movimentação, era significativamente maior que o de policiais, a situação acabou virando de tal maneira que todos os policiais entraram no bar com medo da violência (STONEWALL, 2010).

O que se seguiu foram horas de conflitos. Os frequentadores do bar atearam fogo em latas de lixo, quebraram janelas, atiraram moedas (em referência à propina recebida da máfia), pedras e outros objetos nos policiais, se recusaram a deixá-los levar os clientes presos, cercaram o quarteirão para os impedir de irem embora, saquearam o bar e, enfim, começaram o que ficou conhecido como a Rebelião de Stonewall. No dia seguinte, o bar já estava em funcionamento novamente e a polícia voltou com gás lacrimogêneo e mais violência, mas a população estava preparada. Inspirado e apoiado pelos crescentes movimentos de direitos civis e das mulheres, de ações antiguerra, de Maio de 68 e da contracultura da década de 60, nasce com força o movimento LGBT por direitos.

Fonte: Montagem feita pela autora a partir de imagens da internet.**

Além dos eventos de Stonewall terem incentivado a criação de grupos como a Frente de Liberação Gay e instigado muitos membros da comunidade a se tornarem ativistas, no ano seguinte, para marcar o aniversário de Stonewall, foi organizada uma marcha de protesto no dia 28 de junho, divulgada como “Christopher Street Gay Liberation Day” (em português, “Dia da Libertação Gay Rua Christopher”), considerada a primeira parada de orgulho LGBT, a qual, hoje, é realizada em diversas cidades por todo o mundo. Embora infelizmente tenha perdido muito do seu caráter político e de protesto, e mesmo muitos participantes sequer saberem de sua história, toda parada carrega consigo um pouquinho do espírito de Stonewall.

Referências:
CARTER, David. Stonewall: the riots that sparked the gay revolution. Nova York: St. Martin’s Griffin, jun. 2004. 323 p.)
STONEWALL Uprising. Direção de Kate Davis‎ e David Heilbroner. Nova York: First Run Features, 2010. (82 min.).

*fotodescrição 01: colagem de três fotos em preto e branco. Na esquerda, foto do bar Stonewall Inn como era na época dos protestos: prédio de dois andares, tendo a parte inferior revestina de tijolos aparentes, contornando duas portas com o topo oval e uma grande janela de vidro retangular; e a parte superior pintada de branco; atrelado ao prédio um grande letreiro vertical onde se lê “Stonewall Inn”. Na direita, a foto superior retrata jovens manifestantes na rua sendo empurrados pela policia; eles estão de frente para a câmera e somente as costas dos policiais aparecem na foto; ao fundo, pessoas em escadas observam o tumulto. Na foto abaixo, observa-se um grupo participando de uma parada/marcha; a figura central é um homem de barba preta comprida, boné e com a camisa aberta segurando uma bandeira americana, cuja a ponta, somente, aparece na foto — atrás, ao seu lado direito, dois jovens de cabelo comprido e bigode estão também caminhando, e em seu lado esquerdo, caminhando atrás, pode-se observar outro jovem de bigode e cabelo curto castanho; ao fundo desses três homens, acima de suas cabeças pode se observar uma faixa sendo carregada por participantes da macha, onde se lê “Stonewall means fight back! Smash gay opression! Gay Caucus – Youth Against War & Fascism” (em português, “Stonewall significa revidar! Esmague a opressão gay! Caucus Gay – Juventude Contra Guerra e Fascismo”), sendo que a cabeça do rapaz principal cobre parcialmente a palavra “youth” (em português, juventude).

**fotodescrição 02: colagem de quatro fotos em preto e branco. Na esquerda, a foto superior retrata dois jovens posando em pé na rua com uma faixa onde se lê “Christopher Street Gay Liberation Day 1970” (em português, “Dia da Libertação Gay Rua Christopher 1970”), que seguram por hastes de madeira acima de suas cabeças; ao fundo, vê-se outras pessoas em pé interagindo. A foto inferior retrata um grupo de manifestantes em pé atrás de uma barreira da polícia, na extrema esquerda pode-se identificar Sylvia Rivera, falando de perfil, e ao seu lado Marsha P. Johnson, sorrindo de frente e segurando um guarda-chuva, duas ativistas proeminentes de Stonewall; as outras manifestantes também sorriem, sendo que a da extrema direita segura um cartaz onde se lê “Gay Rights for Lesbian People Vote for Intro 475” (em português, “Direitos dos Gays para Pessoas Lésbicas Vote para a Intro 475”), e apoiado na barreira policial em outro cartaz se lê “Dyke Power” com o desenho de um triângulo logo abaixo. Na esquerda, a foto superior retrata um jovem participante dos protestos de Stonewall sendo confrontado por cinco policiais; ele está de frente para a câmera, virado para a direita, e tem seu braço direito segurado por um policial de costas para a câmera e o outro braço erguido para afastar outro policial que se aproxima pela sua esquerda; o manifestante está posicionado de forma meio abaixada e parece falar alguma coisa para o policial da esquerda. Na foto abaixo, quatro jovens caminham em uma marcha/parada; o da extrema esquerda, negro e de cabelo crespo curto, sorri para a câmera com a boca coberta pela mão esquerda, ao seu lado, dois jovens brancos e de cabelo castanho curto tem o rosto virado para a esquerda, sendo que o terceiro sorri e carrega um balão preto amarrado em um barbante, e o quarto jovem, da extrema direita, branco de cabelo loiro e curto, sorri e carrega uma ponta da faixa que paira acima dos outros três, em que se lê “Gay Liberation Front” (em português, “Frente de Libertação Gay”) e é ilustrada pelos símbolos duplo marte, que representa a homossexualidade masculina, e duplo vênus, que representa a homossexualidade feminina.

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Você conhece as motivações, os significados e as consequências do que fala?

17/06/2020 20:19

Ana Maria Santiago,
Bolsista de Acessibilidade
Letras – Português

Com certeza você já usou ou viu alguém usando alguns termos, tais como “cego” ou “surdo”, como metáforas para burrice, alienação ou até falta de caráter. Exemplos sobre esse tipo de uso não faltam, nos mais diferentes contextos sociais. A internet está cheia deles, seja em sites de notícias ou nas diversas redes sociais. Entretanto, você já se questionou por que isso acontece?

Essas metáforas são tão naturalizadas que parecem algo já dado, simplesmente parte da língua, mas não podemos deixar que isso nos impeça de pensar sobre isso e de mudar de atitude. Além disso, quando essas metáforas são usadas algumas pessoas tendem a pensar que estão sendo inteligentes ou sofisticadas, mas, na verdade, estão sendo capacitistas. Contudo, o que isso significa? Então, vamos entender um pouco mais o porquê você deveria parar de usar esse tipo de metáforas.

O primeiro ponto importante é que a maneira que usamos a língua e, por sua vez, as palavras nunca é aleatória. Nunca! Por si só, o fato de se referir a uma condição, a uma deficiência, ao modo como muitos de nós estamos no mundo, para ofender alguém já é um problema. Deficiência não pode ser sinônimo de ofensa. Se você usa o termo “cego” com o mesmo sentido que alienado ou desinformado, por exemplo, você está associando diretamente que o fato de se ter uma deficiência visual implica em ser alienado ou desinformado; ainda que você não pense assim.

Não importa que não seja a sua intenção. Não importa que você nunca tenha pensado nisso antes. Você está dizendo que essas características pejorativas estão relacionadas a não enxergar, o que também significa que pessoas com deficiência visual seriam alienadas ou desinformadas pelo fato de não enxergarem. Não enxergar, desse modo, é sinônimo de irracionalidade, alienação, ignorância e assim por diante. Como você acha que nós, que de fato somos pessoas cegas, nos sentimos com isso?

Fonte: Cenas do documentário Crip Camp: Revolução pela Inclusão (Disponível na Netflix)*

Vivemos em uma sociedade capacitista que, diariamente e de forma estrutural, entende que as pessoas com deficiência são menos capazes, inclusive menos humanas. Nada mais natural que o uso da linguagem reflita essas visões. Alguns defendem o seu direito a usar metáforas em seu cotidiano, outros, inclusive, dizem que nós que somos pessoas com deficiência exageramos nesse ponto. Todavia, por que não utilizar nossa língua, que é tão nossa, para evitar expressões que não só ofendem pessoas, mas que também ajudam a perpetuar uma estrutura capacitista? Por que insistir nessas metáforas ofensivas? A língua é feita por nós e é dinâmica, a constituímos a partir do que pensamos e do que acreditamos. Então, por que continuar dizendo que acreditamos que pessoas com deficiência são problemáticas ou que carregam características ruins?

Falo aqui da cegueira porque sou uma pessoa cega e isso me atinge de forma direta, mas é igualmente comum usar outras deficiências para ofender e ridicularizar. Repito, isso não é aceitável de jeito algum. Não se justifica. Não existe cegueira intelectual ou surdez seletiva. Essas expressões são apenas reflexo do capacitismo que está arraigado em tudo: em nossa estrutura social, nas instituições e no comportamento. A língua é um instrumento político e pode ser usada para dominação e poder, por isso, cabe a nós desconstruí-la para que não seja mais uma forma de opressão. Pense nisso! Ao disseminar metáforas capacitistas, mesmo sem pensar nelas, você contribui para que as pessoas com deficiência sejam discriminadas e postas à margem da sociedade.

*fotodescrição: A imagem é uma montagem com cinco cenas em preto e branco do documentário “Crip Camp: Revolução pela Inclusão”. À direita da imagem estão duas fotos maiores, uma sobre a outra. Na foto superior, temos um homem negro carregando no colo um homem branco. Ambos muito sorridentes. Ao fundo da foto aparece um homem à direita em uma cadeira de rodas e à esquerda duas mulheres sentadas, uma delas olhando para um outro homem se apoiando em uma bengala. Atrás deles árvores, um vasto gramado e uma grande casa. Na foto inferior, diferentes garotas reunidas sorriem. Uma está de joelhos, três em cadeiras de rodas e três sentadas no chão. Vemos os pés de mais garotas que não estão aparecendo. Estão num grande gramado com arbustos ao fundo e à esquerda. Ao chão há alguns copos e caixas de bebidas, dando a entender que estão num piquenique. À esquerda da imagem, estão três fotos menores. Na foto superior, vemos algumas pessoas diante de grades com a casa branca ao fundo. Duas pessoas estão em cadeiras de rodas, uma mulher e um garoto. O garoto segura um cartaz onde está escrito: “SIGN 504 REG.S NOW” com um símbolo de cadeirante na parte inferior. Na foto do centro, vemos um rapaz negro atrás de uma cadeira de rodas, sem camisa, segurando um violão com sua mão direita, o qual está sobre seu ombro direito. Sua mão esquerda está na cadeira de rodas onde há um garoto sorrindo. Ao fundo, uma estrada de terra que parece ser no campo, com algumas casas à sua direita. Na foto da parte inferior, há um garoto negro com um chapéu de palha e uma camisa de bolinhas brancas com uma jaqueta por cima. À direita dele, há uma menina em uma cadeira de rodas cochichando no ouvido de outro rapaz que também está na cadeira de rodas que quase não aparece. Ao fundo pessoas sentadas no chão e em pé no gramado.

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Pranayamas: O que são? Para que servem?

16/06/2020 16:59

Ana Gabriela Dutra Santos,
Bolsista de Acessibilidade
Letras – Libras

Os pranayamas são respirações conscientes e controladas feitas durante as práticas de yoga. Eles podem ser realizados em todos os momentos do dia. Pranayama deriva de duas outras palavras de origem sânscrita, prana que significa energia vital e yama que significa controle. A respiração, quando feita de forma adequada, nos auxilia a aquietar a mente, a equilibrar nossas emoções, a manter o corpo e organismo saudáveis, entre outras vantagens. Assim, os pranayamas são exercícios respiratórios capazes de trazer diversos benefícios.

Vejamos três pranayamas diferentes para que você possa fazer no seu dia a dia:

1- Chaturánga Pranayama (Respiração Quadrada) – Vídeo disponível, clique aqui!

Este pranayama auxilia no controle da mente, pois ele acalma a respiração e permite que as etapas da respiração tenham efeito no corpo (inspiração, retenção com pulmões cheios, expiração e retenção com pulmões vazios). Assim, este pranayama auxilia no autocontrole, equilíbrio emocional, estabilidade, entre outros, permitindo que você se sinta mais tranquilo/a.

  • Inspire durante quatro (04) segundos;
  • Retenha os pulmões cheios por quatro (04) segundos;
  • Expire durante quatro (04) segundos;
  • Retenha os pulmões vazios por quatro (04) segundos.

Observação: O tempo pode ser alterado conforme você se sinta confortável, pode passar para cinco (05) segundos, seis (06) segundos ou mesmo três (03) segundos. O importante é que todas as etapas da respiração tenham a mesma duração.

2- Maha Pranayama ou Prana Kriya (Respiração Completa) – Vídeo disponível, clique aqui!

Esta respiração é bastante usada nas práticas de yoga, pois ela permite que os pulmões recebam o máximo de ar possível, fazendo com que o ar entre e saia em sua completude, utilizando-se a caixa torácica como um todo. Além disso, esta respiração pode acalmar o sistema nervoso central, sendo bastante recomendado para pessoas com hipertensão e com problemas cardíacos, pois trabalha com os músculos, articulações do aparelho respiratório, cartilagens e sistemas circulatório e digestório.

  • Inspire levando o ar primeiramente para o abdômen, expandindo-o, e, após isso, permita que o ar chegue até o início do tórax, afastando suas costelas, e, em seguida, preencha a parte superior do tórax.
  • Expire, soltando primeiro o ar da parte superior do tórax, e, após isso, solte o ar da parte inferior do tórax e, em seguida, o do abdômen, fazendo os movimentos inversos da inspiração.

Observação: Você pode colocar as mãos sobre o abdômen para senti-lo se expandir, bem como sobre as costelas para as sentir se afastando e, por fim, sobre a parte superior do tórax (peito) sentindo-o se expandir (a expansão da parte superior é suave, pouco perceptível).

3- Eka Surya Bedha Pranayama (Respiração apenas pela Narina Solar) – Vídeo disponível, clique aqui!

Este pranayama pode aumentar a energia corporal, acordar a mente e aquecer o corpo. Excelente para praticar pela manhã ou antes dos estudos e trabalho, pois ajuda a despertar. Assim, este pranayama é uma ótima dica para quem está devagar ou com preguiça de fazer suas atividades. Não é muito indicado para se praticar a noite, mas, se o fizer, tenha consciência de que, possivelmente, ficará mais desperto.

  • Com a mão em Chin Mudrá (o mudrá da foto) feche a narina esquerda;
  • Inspire e expire pela narina direita, pode acrescentar retenções durante a respiração.

Fonte: Arquivo Pessoal. Ana Gabriela em postura do Yoga*

Espero que façam esses pranayamas e sintam os benefícios que eles podem trazer. É importante lembrar que existem diversos pranayamas, não apenas esses três. Se sentirem interesse e quiserem aprender mais sobre estas respirações, sugiro que procurem um/a professor/a de yoga e que peçam a ele/a que lhes ensine e explique sobre outros pranayamas.

Namastê!

Fotodescrição: Ana Gabriela está sentada sobre um tapetinho azul. Ela está de calça legging cinza e blusa de frio de cor salmão claro. Ela está sentada com as pernas flexionadas de forma que a sola do pé esquerdo encosta em sua coxa direita e a perna direita está na frente da perna esquerda. Seu cabelo está solto sobre seus ombros. Seus olhos estão fechados e ela está com sua mão esquerda apoiada no joelho esquerdo e sua mão direita em Chin Mudrá (dedos polegar e indicador com as pontas unidas formando um círculo e dedos mínimo, anelar e médio estendidos) em que o dorso dos dedos médio, anelar e mínimo pressionam a narina esquerda, fechando-a. Atrás de Ana Gabriela há um sofá nas cores marrom escuro e claro e ao fundo uma cortina branca.

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Dedico este texto aos não tão amantes da literatura

15/06/2020 21:25

Sarah Ortega,
Bolsista PET-Letras
Letras – Espanhol

Na bolha social de uma estudante de Letras, a leitura, nesta época de quarentena, tem aumentado exponencialmente. A curiosidade e, ouso dizer, até mesmo, a necessidade para compreender, refletir ou usá-la como válvula de escape para as diferentes realidades caóticas que estamos e sempre estivemos — mas que para alguns foi aflorada somente pela pandemia — é um sustento para uma mente saudável. Contudo, ao mesmo tempo, observo mais atentamente alguns, inclusive familiares, para quem a literatura não se fez amiga e é para eles que escrevo. Hei de recomendar alguns clássicos nacionais que rompem com o estereótipo de que a leitura seria monotonia e incompreensível subjetividade.

A leitura de clássicos literários é, muitas vezes, associada a um livro gigantesco, tedioso e de difícil entendimento, mas que de alguma forma se fez famoso. Não se engane, alguns fazem jus à fama, mas aqui vou recomendar aqueles que, a meu ver, dão gosto de ler, que afloram diferentes sentimentos e com uma quantidade nada “indecente” de páginas.

Fonte: Arquivo pessoal. Montagem com Caio, Lygia e Nelson, feita pela autora*

Um gênero que em minha opinião é divertidíssimo para começar é a peça de teatro. Acredite! Ler é tão intrigante quanto fazer performance. Assim, escolho o queridinho, mas polêmico, Nelson Rodrigues e seu livro Beijo no Asfalto. Dramaturgo que teve suas peças adaptadas em novelas da Rede Globo de Televisão, Nelson é para aquela tia conservadora que gosta de ouvir uma fofoca trágica. Acredite! O final da obra irá impactá-la.

Aproveitando o solo de leituras provocativas, Morangos Mofados de Caio Fernando de Abreu não poderia faltar, com críticas ácidas e dissimuladas, é um ótimo livro para ler em uma bela tarde de inverno acompanhado de um chá, mas cuidado para não queimar a língua com a escrita excitante do autor.

Por último, deixo o palco com a grande escritora paulista Lygia Fagundes Telles, uma grande contista brasileira que ganhou o Prêmio Camões e qualquer coração humano que a ler. Essa mulher não tem piedade de seus leitores. Com uma narração, muitas vezes, simples, esconde uma vastidão de dúvidas e possíveis acontecimentos, aquela pegada de “Capitu: traiu ou não?”, fica a escolha do leitor — traiu não, mas deveria; e, se traiu, traiu pouco —, mas como a própria escritora diria em seu conto Potyra — para mim não há outra frase que mais traduza sua literatura: “Não peça coerência ao mistério nem lógica ao absurdo”.

Compartilhe essa matéria com seus familiares e os incentive a se entregar a leitura!

Leia bastante, não somente nessa quarenta! Fica a dica!

* fotodescrição: imagem em fundo preto com riscos cinzas. Há uma colagem em preto e branco com três rostos. No canto esquerdo está Caio Fernando de Abreu, é um homem branco, com sobrancelhas grossas e cabelo raspado, usa óculos e tem suas mãos cruzadas de forma a tapar seus lábios inferiores. Em seu lado direito, e ao meio, está Lygia Fagundes Telles, uma mulher branca com finas sobrancelhas, usa batom, tem um cabelo liso e dividido de lado. Ao seu lado direito, no canto esquerdo da imagem, está Nelson Rodrigues, é um homem branco que tem sobrancelhas grossas, cabelo liso penteado para trás e tem sua mão esquerda posicionada com o polegar para o alto e o indicador para frente.

 

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Que tal um livro antirracista para esta quarentena?

10/06/2020 18:20

Moara Zambonim,
Bolsista PET-Letras
Letras – Português

Enquanto ondas de protestos antirracistas se espalham ao redor do mundo em decorrência do assassinato de George Floyd — homem negro norte-americano morto pela polícia no dia 25 de abril de 2020 — muito tem se falado da necessidade de engajamento de pessoas não-negras nos debates raciais.

Uma vasta lista de autoras, vinculadas principalmente ao feminismo negro, tem se popularizado nos últimos anos no Brasil. O movimento é embalado por obras de linguagem acessível e dinâmica, com visões acadêmicas e literárias usadas para discutir fenômenos complexos como o racismo e o sexismo.

Dentre essas autoras, destaco o trabalho da intelectual afro-americana bell hooks. A autora escolhe esse pseudônimo em homenagem à sua bisavó, Blair Bell Hooks e ainda afirma escrevê-lo em letras minúsculas numa tentativa de dar mais foco às suas ideias do que à pessoa por trás delas. Em especial, o seu livro “O Feminismo é Para Todo Mundo”,  publicado em 2000.

Fonte: Arquivo Pessoal*

Ao falar sobre a necessidade de lutarmos pelo fim da violência, por exemplo, a escritora pontua que mulheres e homens “nesta sociedade, aceitam e perpetuam a ideia de que é aceitável que uma parte ou grupo dominante mantenha seu poder sobre o dominado por meio de força coercitiva” (HOOKS, 2019. p. 98).

Para todos aqueles que se interessam pelos movimentos das últimas semanas — não os entendem bem, estão intrigados ou têm curiosidade —, a leitura de bell hooks pode ser um bom começo!

* Fotodescrição: Sobre um tapete branco, estão dispostos uma xícara branquinha com café, ao lado de um pé de moleque e o livro da bell hooks “O feminismo é para todo mundo”. Abaixo do título, lê-se “políticas arrebatadoras.” A capa é laranja escura e traz uma foto da autora, com seu rosto cortado pela metade, na vertical. Da xícara, saem rabiscos beges, imitando a fumaça do café.

Quem tem medo do racismo?

09/06/2020 18:26

Nicole da Cruz Rabello,
Bolsista PET-Letras
Letras – Inglês

Neste texto, vou lhes apresentar a obra “Pequeno Manual Antirracista” de Djamila Ribeira, mas primeiro quero lhe instigar a pensar sobre o porquê esse título — “Quem tem medo do Racismo?” — chama a atenção! A palavra Racismo é muitas vezes tratada como tabu dentro da comunidade branca, pois muitos não querem se ver como racistas. Contudo, não percebem que suas falas e atitudes contém racismo. Por isso indago, quem são essas pessoas que tem medo? Não são só os negros vítimas dessa violência, mas também os agressores brancos que não querem ter esse título associado a eles.

Fonte: Pinterest – imagem de um garoto negro como alvo *

Entretanto, por que falar de racismo em meio a uma pandemia? Ora, com a crescente veiculação midiática de casos de racismo, principalmente nas redes sociais, vemos que o  racismo no Brasil e no mundo está sendo, cada vez mais, exposto. A população se armou, não com armas, mas com câmeras para registrar as agressões e as discriminações físicas e verbais que antes passavam desapercebidas. E os agressores, por não terem sua identidade revelada, acabam por não serem responsabilizados nem sofrerem as devidas ações judiciais/jurídicas cabíveis em casos de racismo. Todavia, por que filmar e expor esses “cidadãos”? Não é apenas uma forma de expor a sua imagem ou degradá-la? Não, isso é feito para que esses atos racistas não se repitam nem passem impunes pelo sistema judiciário, e para que esses agressores não perpetuem esses atos repulsivos, abusivos e desnecessários.

Racismo e injúria racial são crimes no Brasil, mas qual a diferença entre os dois? De modo geral, injúria seria ofender a honra do indivíduo por sua raça, cor, religião ou origem; e  racismo seria uma ação discriminatória direcionada a um grupo ou coletivo específico, sendo este mais grave e inafiançável. No entanto, se fizermos uma breve pesquisa na internet perceberemos que, ainda que a população negra corresponda a 56% da população do Brasil, os casos de racismo e injúria que, de fato, vão a julgamento são poucos. E esses poucos, segundo o Laboratório de Análises Econômicas, Socias e Estatísticas (Laeser), evidenciam que 70% das ações por crime de racismo ou injúria racial no país tendem a pender em favor do réu, totalizando 66,9% dos casos vencidos pelo réu e 29,7% de casos vencidos pela vítima .

De acordo com uma pesquisa feita pela Globo News, no Rio de Janeiro, de 1988 a 2017, somente 244 processos de Racismo e Injúria Racial foram concluídos, dando uma média de 8 casos por ano. E destes processos, 40% dos casos foram considerados improcedentes pelo judiciário cível e 24% foram absolvidos na área criminal. No Tribunal de Justiça do Rio, apenas quatro casos de racismo foram julgados em 2017 e oito em 2016.  Em uma reportagem do site Geledés, os números no Tribunal de Justiça da Bahia são ainda mais baixos, de 2011 a 2018 houve apenas um processo julgado por ano.

Bom, depois de mencionar todos esses dados, quero que você reflita novamente! O sistema judiciário brasileiro é racista? Bom, já consigo imaginar sua resposta. Então vamos ao foco da minha reportagem, que tem como objetivo te ajudar a visualizar e combater os casos de racismo. Como? Sendo ANTIRRACISTA.

Vinda de uma comunidade pobre, a jovem Djamila apenas conseguiu entrar na Unifesp aos 27 anos, com uma filha, e pelo sistema de políticas de ações afirmativas, pois cota não é esmola, mas, sim, uma reparação social e histórica para com a comunidade negra. Ela é filósofa, feminista, escritora e acadêmica. Ela se tornou famosa por seu forte engajamento cyber ativista nas redes sociais. Atualmente, Djamila faz palestras pelo mundo falando sobre feminismo, raça e gênero, além de ser colunista no jornal Folha de São Paulo. Seu livro “Pequeno Manual Antirracista” foi publicado em 2019, pela Companhia das Letras.

Fonte: Google Images – foto de Djamila e sua obra **

Este livro, com linguagem simples e didática, é um guia para as pessoas pararem, refletirem e observarem os casos de racismo ao seu redor, mas não só observar, mas, sim, evitar, reagir e dialogar sobre. O Pequeno Manual Antirracista traz em seu conteúdo temas chave do dia a dia para as pessoas identificarem o porquê são racistas. Por exemplo a cultura da hipersexualização e marginalização do negro e da negra na mídia como bêbado, relaxado, gay afeminado e periférico, desdentado ou a mulata bonita de corpo esbelto e sensual.

Há também a expressão “wikipreta” onde Djamila tira o fardo de apenas as pessoas negras terem que saber tudo sobre sua cultura, etnia e história. Instigando e estimulando que o branco vista a camisa antirracista e comece também a dialogar, discutir e estudar sobre questões raciais dentro do seu grupo social e familiar, tirando essa responsabilidade da comunidade negra e dividindo-a com a comunidade branca. Um dos temas abordados é a falta de leitura de obras de autores negros e de autoras negras, dentro e fora da academia, isto é, a falta de representatividade negra desde a literatura infantil até a acadêmica e canônica.

Entretanto, vale destacar que o tema mais importante no livro, na minha opinião de leitora negra, é a abordagem feita sobre o reconhecimento por parte do branco de seus privilégios para que, através disso, ele também possa combater o racismo dentro das escolas e ambientes de trabalho. Isso nos leva a mais perguntas: quantos negros e negras você vê ocupando um cargo de diretoria ou chefia? E quantos negros e negras você observa trabalhando como copeiras/os, faxineiras/os ou garçons/etes? Faço essas indagações, pois já fui confundida, muitas vezes aqueles que estão nessas profissões, mas, por outro lado, em nenhum momento fui confundida com aqueles que ocupam cargo postos socialmente como mais importantes.

Leia, preencha-se, observe-se e mude, mas, não só você, e, sim, o ambiente ao seu redor.

Combata o racismo, seja antirracista.

*Fotodescrição da Imagem 1: A imagem é um quadro pendurado em uma parede de tijolos a vista, a arte no quadro foi feita digitalmente. Imagem de fundo laranja com um menino negro, em pé, aparecendo do joelho para cima. O menino tem uma expressão neutra. Ele veste uma camisa preta com o desenho de um alvo de tiro em branco no centro do seu peito. No meio do desenho do alvo há um ponto vermelho indicando o local central do alvo de tiro.

** Fotodescrição da Imagem 2: Imagem de fundo rosa, ao centro Djamila Ribeiro, uma mulher negra, jovem, com os cabelos trançados curtos e presos para cima. Ela usa um brinco comprido e fino de cristais na orelha direita e está com o rosto levemente virado para a esquerda. Ao lado da imagem está a foto do livro, com a capa amarela e os dizeres em preto “Djamila Ribeiro”, em cima com letras grandes, ao centro “Companhia das Letras”, em letras pequenas, e abaixo “Pequeno Manual Antirracista”, em letras grandes. Ao redor das palavras estão pequenos riscos de distintas tonalidades de tons de pele.

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A poesia italiana de Antonia Pozzi: uma dica de leitura

08/06/2020 18:33

Camila Vicentini Camargo,
Bolsista do PET-Letras
Letras – Italiano

Enquanto estamos em casa tentando enfrentar tudo da melhor maneira que conseguimos, nada melhor do que, quando possível, nos cercarmos de arte, música, filmes e… poesia. Pensando nisso, decidi apresentar um pouquinho do trabalho da poetisa italiana Antonia Pozzi.

Ouvi falar dela, pela primeira vez, no filme Me Chame Pelo Seu Nome, de Luca Guadagnino. Se trata de uma adaptação do livro homônimo publicado em 2007 pelo egípcio André Aciman. Em dado momento, uma personagem agradece ao amigo pela recomendação de leitura de um livro de poesias.

Lembro de ter anotado o nome para pesquisar mais tarde e devo dizer que foi a melhor coisa que fiz, porque, hoje, considero suas poesias as mais lindas de todos os tempos. São poesias de versos livres, sem compromisso com rimas ou estrutura regular — uma forma muito atraente, a meu ver, de se ler poesia.

Antonia Pozzi nasceu em 1912, em Milão. Suas poesias foram publicadas em quantidade limitada em 1939, pelos seus pais, cerca de um ano após seu suicídio. Em 1943, o livro foi reimpresso, em edição ampliada, devido à positiva receptividade. Apesar das obras ainda não disponíveis no português brasileiro, você pode encontrar aqui alguns textos traduzidos pela portuguesa Inês Dias.

Fonte: Montagem feita por Camila a partir de fotos retiradas da internet*

Tamanha é a força e a beleza das palavras de Antonia. Seu tom melancólico se alia ao frescor de uma natureza sempre presente e seu tom de enfrentamento se alia à vulnerabilidade da vida cotidiana. E por trás de cada texto, há um universo a ser — mais do que decifrado — sentido.

Eu simplesmente amo tudo o que essa mulher fez e espero que você goste também! Acredito que tirar um tempinho para ler coisas que nos fazem bem e para conhecer novas artes é fundamental nesse momento de tantos medos e incertezas.

Boa leitura!

*fotodescrição Sequência de três fotos em preto e branco montadas lado a lado na horizontal. Na foto da esquerda, vemos Antonia Pozzi de pé em uma grama alta, com as mãos nos bolsos da calça. Está sorrindo, com a testa levemente franzida pelo sol que bate em seu rosto. Antonia está vestindo uma calça branca e camisa branca de manga curta. Atrás dela, vemos um arbusto e, à direita da foto, parte desse arbusto faz sombra em sua perna esquerda. Na foto do meio, em primeiro plano, vemos Antonia sorrindo, com as pernas abertas sentada em uma pedra, segurando um pedaço de neve em sua mão direita. Está vestindo um coturno preto, meias listradas, uma calça larga de alfaiataria que vai até um pouco abaixo do joelho, um casaco também de alfaiataria e uma echarpe estampada nas pontas. Em segundo plano, há um espaço coberto pela neve, como uma suave colina. Ao fundo, há pinheiros. Na foto da direita, vemos Antonia em cima de uma bicicleta, num estreito caminho de areia. Atrás dela o caminho faz uma leve curva para a direita. Antonia segura nos guidões da bicicleta, enquanto apoia seu pé esquerdo no chão e esboça um leve sorriso. Antonia veste calça e sapatos pretos, camisa branca de manga curta e gravata preta. À direita da foto, um arbusto com flores parte do chão até a altura do rosto de Antonia. À esquerda da foto e atrás de Antonia, vemos outros arbustos com menos flores, do outro lado do caminho de areia. Ao fundo, vemos algo como um campo, e algumas árvores de tronco fino.

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A vida e a obra de Oscar Wilde: quem ele foi e quem ele representa hoje?

05/06/2020 19:51

Luciana dos Santos,
Bolsista PET-Letras
Letras – Inglês

Oscar Wilde foi um autor irlandês do século XIX muito aclamado pela crítica. Contudo, não só a crítica julgou Wilde. O público também o julgou, o aplaudiu e o observou quando ele estava no pelourinho. Hoje, a sua figura tem outras representações e interpretações. Pode-se dizer que, na visão de alguns, o autor que foi do céu ao inferno, foi salvo como um mártir.

A biografia de Wilde poderia muito bem ser o plot de uma de suas peças de teatro. Filho de uma poetisa e um médico, Wilde teve uma origem privilegiada e o fim de sua vida foi caracterizado pelo anonimato e pela pobreza, sendo a sua própria vida uma das histórias de ascensão e queda mais marcantes na história da Literatura. Os acontecimentos que determinaram a sua queda foram em decorrência do envolvimento de Wilde com Lord Alfred Douglas, ou “Bosie”, relação que fez com que ele perdesse sua reputação e seu prestígio. Quando o pai de Bosie, Marquês de Queenberry, chamou Wilde publicamente de sodomita, Wilde deflagrou um processo contra ele por difamação. Contudo, ao final do primeiro julgamento, Wilde passou, de parte ativa no processo, ao banco dos réus, pelo crime de comissão de “ato libidinoso com homens”, devido a diversas provas de que Wilde se envolvia romanticamente com outros homens. Nisso, Wilde foi condenado à prisão, tendo que cumprir dois anos de trabalhos forçados, de 1895 a 1897.

Wilde e “Bosie” em Oxford, por volta de 1893 (British Library)*

Enquanto cumpria sua pena na prisão de Reading e quando se exilou após ganhar liberdade, Wilde escreveu sobre a experiência do cárcere. Dentre esses escritos, há o poema A Balada do Cárcere de Reading (The Ballad of Reading Gaol), inspirado no enforcamento de um dos prisioneiros, e algumas cartas que foram publicadas em jornais, nas quais ele denuncia casos de maus-tratos contra crianças, além das condições precárias de subsistência, e outras irregularidades na prisão. Ademais, outros detalhes de sua vida na prisão foram divulgados com a publicação póstuma de De Profundis, forma como é conhecida uma longa carta chamada Epistola: in Carcere et Vinculis que Wilde escreveu para Bosie enquanto estava na prisão. Esses escritos reforçam a visão de que Wilde era vítima de um sistema social repressivo e cruel, que ele fez questão de criticar e expor antes, e, principalmente, depois da sua experiência no cárcere.

Trevor Fisher (2008) compreende a evolução da reputação de Wilde em quatro fases: (1) estudante universitário em Oxford; (2) escritor com uma carreira literária de sucesso; (3) época das disputas judiciais e, em seguida, seu encarceramento; e (4) uma trágica figura cultural e literária. Na sua fase literária de escritor de sucesso, destacam-se obras como O Retrato de Dorian Gray (The Picture of Dorian Gray); diversas peças que o autor escreveu, como A Importância de ser Prudente (The Importance of Being Earnest); contos, como O Crime de Lord Arthur Savile (Lord Arthur Savile’s Crime); e ensaios, como A Alma do Homem sob o Socialismo (The Soul of Man Under Socialism), no qual Wilde também tece críticas sociais.

Fonte: Arquivo pessoal de Luciana dos Santos**

Atualmente, sobre a imagem de Wilde vista pelo público atual, o que se predomina é a impressão de que ele foi um mártir por conta de seu comportamento que, hoje em dia, conhecemos como homossexualidade. Nos tempos de Wilde, pouco se falava sobre isso — nem se nomeava —, e havia muita repressão contra pessoas como ele, inclusive por meio de instituições jurídicas, com base em normas decretadas. Na atualidade, em nosso país, não se tratam mais de infratores da lei, mas continuam sendo indivíduos atacados e perseguidos em nossa sociedade, situação que persiste mais de dois séculos após o encarceramento de Wilde.

Oscar merece por muitos motivos ser lido, conhecido e reconhecido. Ele foi um artista extremamente talentoso e à frente de seu tempo: uma mente brilhante que foi vítima de um sistema, mas que deixou um belo legado. Vamos conhecer melhor Oscar Wilde? Que tal começar a lê-lo?

Referência

FISHER, Trevor. Oscar Wilde and the Dynamics of Reputation. The Wildean, No 33, pp. 57-65, Jul. 2008.

*fotodescrição: Wilde e Douglas aparecem juntos na foto antiga amarelada. Wilde tem cabelos escuros e está à esquerda, sentado em um banco, de pernas cruzadas, e olhando para nós. Ele está com a mão direita levantada e segurando um cigarro entre os dedos indicador e médio. Seu braço esquerdo dá a volta nas costas de Bosie, que está sentado ao seu lado esquerdo. Ele veste um paletó escuro com linhas verticais. À direita, sentado no banco, está Bosie, que tem cabelos claros e cruza as pernas, olhando o horizonte. Suas mãos estão em cima de um chapéu em seu colo. Ele veste uma calça bem clara e um paletó, um chapéu e uma camisa mais escuros.

**fotodescrição: Imagem com quatro livros sobre um fundo bordô texturizado. No topo da imagem, a parte de cima de um livro, com o nome Oscar Wilde em branco no topo com fundo preto, e “De Profundis” logo embaixo em preto em um fundo amarelo. Abaixo, o subtítulo “e outros escritos do cárcere”. À esquerda, um livro com um desenho de Oscar com a mão no queixo olhando para nós num fundo bege claro. Embaixo, está escrito “Contos Completos” em branco num fundo preto. À direita, um livro com uma capa com desenhos que remetem às penas de um pavão, com linhas cinza claro, fundo cinza chumbo e formas circulares vermelhas. Na parte de baixo da capa, há um retângulo vertical branco, onde está escrito em preto: Oscar Wilde, e, embaixo, O Retrato de Dorian Gray. No meio, em cima de todos os livros há um livro com uma foto preto e banco de Wilde no centro da capa, que tem um fundo cinza. Ele está usando um casaco de pele preto e olha para nós. No topo da capa, lê-se National Bestseller, e em baixo Oscar Wilde, em preto. Na parte de baixo da capa, está escrito o nome do autor da biografia Richard Ellman em preto.

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