Revista Preguiça do PET-Letras – 3ª edição

30/06/2021 16:29

Preguiça, a revista (des)acadêmica do PET Letras, foi pensada, inicialmente, para proporcionar a interação social e criativa dos alunos de diferentes fases dos cursos de Letras.
Surge, então, como um meio de divulgação local das produções literárias dos estudantes, oferecendo um estímulo à produção criativa, por disponibilizar um veículo institucionalizado para a divulgação de ideias dos alunos; e que gerasse reconhecimento e identificação dos seus autores.
Logo em sua primeira edição, a Revista Preguiça passou a receber textos escritos por alunos de todos os cursos de graduação da UFSC, possibilitando, então, a integração das mais diversas áreas, que se voltam para um mesmo objetivo, a produção literária.

A terceira edição da Preguiça conta com textos de estudantes de graduação em Letras da UFSC, de petianos e petianas e, também, de autores externos à Universidade.

Boa leitura!

Revista Preguiça em PDF

*Ilustração por Lara Norões Albuquerque

Confira as edições anteriores:
Revista Preguiça 1
Revista Preguiça 2

#fotodescrição: Logotipo da Revista Preguiça, que consiste em três rostos iguais de um bicho-preguiça, em escala de cinza, do mais escuro, à esquerda, para o mais claro, à direita.

Conflitos na Colômbia: você sabe o que está acontecendo?

28/06/2021 19:59

Andres Salas Garcés,
Bolsista PET-Letras
Letras Libras

A explosão social insurgida durante a pandemia, há dois meses na Colômbia, é resultado de uma bola de neve manchada de muito sangue e carregada de violência.

Para entendermos o que está acontecendo, precisamos saber que algo comum e predominante na história política colombiana é a eliminação de grupos e de pessoas por causa de sua ideologia. A guerra dos mil dias (1899-1902), por exemplo, foi uma guerra civil causada por as diferenças entre dois partidos tradicionais, o partido Conservador1 e o partido Liberal2, nesta guerra morreram mais de cem mil pessoas e, logo depois, com influência dos Estados Unidos, a separação territorial do que hoje é o  Panamá. Nesse período, quem governava era o partido Conservador e os militantes do partido Liberal foram perseguidos e mortos pela força pública, famílias inteiras foram exterminadas. Isto fez que aqueles militantes se juntassem aos grupos de campesinos que lutavam por seus direitos e começassem a se armar, criando assim, as primeiras guerrilhas.

Fonte

A Guerrilha Liberal tinha ideologia agrária, pois a maioria dos seus integrantes eram campesinos unidos a outros militantes do partido liberal e não eram de esquerda nem direita. Os militantes que decidiram assinar a anistia com o governo, foram massacrados e exterminados na ditadura de Rojas Pinilla3. Trinta anos depois de muita violência, outro grupo armado, mas desta vez com ideais comunistas, começou surgir: as FARC-EP (guerrilha de ideologia marxista-leninista de inspiração bolivariana).

O poder que governava o país, durante esses últimos anos, era passado entre as mesmas famílias ou pessoas próximas a elas, portanto, tinha-se péssimos governantes, mas excelentes negociantes. Isto trouxe muitas problemáticas sociais, além da violência por conta dos grupos armados, que, no exercício de recrutamento de jovens e menores de idade, iam ficando cada vez maiores.

Com uma necessidade realmente urgente de resolver os problemas sociais que o governo já não estava dando conta, nos anos 1980 surgiu o primeiro tratado de paz com as FARC, criando-se o partido político conhecido como UP (União Patriótica), mas a história se repetiu, “no dia 11 de Novembro de 1988, quarenta militantes foram publicamente executados na praça central do município de Segóvia...”, hoje são poucos os militantes da primeira geração desse partido que sobreviveram para contar a história.

As guerrilhas começaram a se apoderar de terrenos e a cobrar impostos para grandes terratenentes, empresas e narcotraficantes que queriam transportar sua mercadoria. O governo, encarregado por Alvaro Uribe Vélez, no ano 2008, criou o grupo “El Porvenir”, deu armas e treinou cidadãos com o objetivo de dar segurança privada para aqueles empresários e terratenentes que eram vítimas das guerrilhas. Mas não só eles foram beneficiados, os narcotraficantes também começaram a financiar esse grupo para receber proteção, dando início ao paramilitarismo. Uribe nunca foi punido por isso, nunca houveram provas suficientes para incriminá-lo, porém os grupos paramilitares com o discurso de limpeza social e acabar com guerrilheiros, foram os responsáveis de 21.000 assassinatos. Mais mortes do que qualquer outro grupo armado no país4. Santiago Uribe, irmão do ex-presidente Alvaro Uribe foi aprendido5 por pertencer a grupos paramilitares6, além de ligações da sua família com narcotraficantes7. Ele tem sido umas das pessoas mais poderosas do país nos últimos 30 anos, depois de dois mandatos consecutivos e de ser rejeitado pela corte suprema da justiça por querer fazer o terceiro mandato, ele tem escolhido os últimos 2 presidentes após dele.

Hoje, a história não é muito diferente, os conflitos entre guerrilhas que nasceu por ideologias diferentes, ainda existem. Atualmente, o governo tenta quebrar os novos acordos de paz com as FARC-EP, enquanto os paramilitares massacram8 ex-guerrilheiros e líderes sociais9, mais ou menos 13 bilhões de dólares são roubados a cada ano por corrupção10 e as médias ao invés de vigiar o governo, o protege porque pertencem às famílias mais poderosas da Colômbia11.

Durante a crise da pandemia, causada pelo novo Coronavírus, o governo criou uma reforma tributária para cobrir as dívidas externas e a crise provocada pela pandemia, e pretendia taxar, entre outras coisas, alguns produtos da cesta básica e os serviços fúnebres12, sendo o detonante para protestos massivos de uma sociedade jovem e crítica. O presidente atual, Ivan Duque, demorou dias para derrubar tal reforma, dias em que policiais escondiam seus códigos de identificação e outros se vestiam de civis para matar13 e abusar sexualmente14 de estudantes e de pessoas que protestavam pacificamente.

Os protestos continuaram, assim como as mortes por parte da polícia, o comandante justificava as mortes por serem financiadas e dirigidas por grupos guerrilheiros em alguns atos vandálicos contra bancos e multinacionais. Segundo o Diretor das Américas da Human Rights Watch, José Miguel Vivanco, em uma entrevista com o comandante da Polícia Nacional Colombiana, não houve provas suficientes para respaldar aquelas justificativas de infiltração de grupos armados no protesto15, ele foi muito criticado por vários meios internacionais por suas afirmações sem fundamentos concretos porque criminalizava o protesto e reprimia o povo.

Representantes da Comissão Interamericana dos Direitos Humanos, em uma tentativa de registrar o que estava acontecendo com os atos de violência durante os protestos, foram impedidos de entrar no país16 quando chegaram no aeroporto no dia 25 de maio de 2021. Depois de insistirem17 repetidamente pela aprovação da visita, ela foi aprovada como condicionada, no dia 06 de junho de 202118.

Hoje, os protestos e bloqueios ainda persistem, esperamos que o governo escute os jovens e pare de matá-los.

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Notas

1 Inicialmente foi fundado com o objetivo de proteger as tradições sociais e religiosas, além de promover o protecionismo econômico voltado para os artesãos e a construção de um estado intervencionista em oposição ao estado liberal de livre comércio.

2 Inicialmente de tendência liberal clássica e posteriormente social-democrata

3 https://www.revistacredencial.com/historia/temas/1949-1953-la-guerrilla-liberal

4 https://rutasdelconflicto.com/masacres

5 https://brasil.elpais.com/brasil/2018/06/12/internacional/1528778541_006928.html

6 http://www.centrodememoriahistorica.gov.co/micrositios/balances-jep/paramilitarismo.html

7 https://www.eltiempo.com/archivo/documento/MAM-1367359

8 https://rutasdelconflicto.com/masacres

9 https://www.france24.com/es/am%C3%A9rica-latina/20210420-colombia-asesinatos-lideres-sociales-exfarc-jep

10 https://www.publimetro.co/co/noticias/2020/07/01/las-lamentables-cifras-de-la-corrupcion-en-colombia.html

11 https://www.america-retail.com/colombia/colombia-las-fortunas-mas-importantes-del-pais-y-sus-aportes/

12 https://noticias.caracoltv.com/economia/en-plena-pandemia-reforma-tributaria-busca-gravar-servicios-funerarios-y-de-cremacion

13 https://es.wikipedia.org/wiki/Anexo:Fallecidos_durante_las_protestas_en_Colombia_de_2021

14 https://www.elconfidencial.com/mundo/2021-05-14/colombia-denuncia-suicidio-menor-sufrir-abuso-sexual-policia_3080279/

15 https://www.youtube.com/watch?v=uCvf7l4co_w

16 https://www.eltiempo.com/mundo/eeuu-y-canada/gira-de-marta-lucia-ramirez-colombia-no-aceptara-visitas-de-cidh-y-oea-590780

17  https://www.eltiempo.com/mundo/eeuu-y-canada/la-cidh-insiste-en-que-quiere-realizar-su-visita-a-colombia-591009

18 https://www.elcolombiano.com/colombia/gobierno-acepta-visita-de-la-cidh-pero-con-condiciones-NM15083482

 

Descrição: Foto a noite com algumas árvores e palmas no fundo, no centro tem um monumento em forma de um braço com uma mão pintada com muitos grafites de muitas cores, figuras e  imagens de alguns estudantes mortos durante o protesto, no lado inferior esquerdo do braço, tem alguns escudos de metal feitos artesanalmente com a face das pessoas que o usavam e hoje estão mortas, todo o braço está iluminado com uma luz azul, a mão está segurando uma tabela que disse “RESISTE” com letras brancas e fundo vermelho e amarelo. Na parte de baixo, há uma multidão de pessoas, uns tirando fotos e outro com um cartaz branco com letras negras.

 

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Inglês como língua de transformação: um manifesto.

23/06/2021 16:02

Vítor Pluceno Behnck,
Graduando em Letras – Inglês
Bolsista PET-Letras UFSC

            De uma coisa você já sabe: a língua inglesa é uma das mais faladas em todo o mundo. De acordo com o website da Encyclopædia Britannica, o Inglês é a primeira ou segunda língua de 1,27 bilhão de pessoas, o que lhe confere o status de língua mais falada no mundo. A predominância do Inglês como Língua Franca, no século XXI, advém de fatos históricos como a vasta colonização britânica ao redor do globo e o estabelecimento dos Estados Unidos da América como centro do capitalismo ocidental, desde a Guerra Fria. Entretanto, é de suma relevância nos questionarmos sobre quais seriam as implicações linguísticas e ideológicas presentes na propagação do Inglês no mundo. Afinal, falar um idioma é, também, um ato político.

            Voltando algumas centenas de anos, podemos, primeiramente, entender de onde vem a língua inglesa, o que é relevante à compreensão do lugar que ela ocupa hoje. O Inglês é uma língua Germânica, prima do Alemão e do Holandês. De acordo com o website EnglishClub.com, a história do idioma tem início com a chegada de três tribos germânicas à Grã-Bretanha durante o século V d.C. Conforme exposto na Figura 1, os anglos, jutos e saxões expulsaram os celtas que habitavam aquelas terras para o oeste e para o norte, em direção ao que hoje compreende o País de Gales, a Escócia e a Irlanda. Segundo o website, os anglos vieram da “Englaland”, e sua língua era o “Englisc”, o que, posteriormente, teria se tornado a Inglaterra (England) e o Inglês (English) que conhecemos hoje.

Mapa de imigração anglo-juto-saxônica no século V d.C.*

Reprodução: EnglishClub.com.*

            A partir de então, a língua inglesa evoluiu para outras formas, como o Old e o Middle English, que serviram de base para o Modern English, sendo esse “um dos Ingleses” que falamos hoje. Por que eu me refiro a “um dos”? Bem, é simples: por ter sido internacionalizada, possibilitando o surgimento de muitos sotaques e variantes do Inglês padrão do Reino Unido ou mesmo dos Estados Unidos. Um dos exemplos mais claros disso é o African American English (AAE, também chamado de Ebonics), que, de acordo com a Linguistic Society of America, é uma variante falada pelas comunidades afro-americanas dos Estados Unidos. Com diferenças fonéticas e inclusive gramaticais, o Inglês Afro-Americano foi, inclusive, considerado uma segunda língua, com status oficial, em programas de ensino bilíngue pelo Oakland School District (Distrito Escolar de Oakland, em Português), em 1996.

            Assim, podemos perceber que as raízes colonialistas advindas do Império Britânico possuem ressonância nos processos linguísticos do Inglês. Não obstante, o imperialismo estadunidense e a propaganda yankee, no mundo capitalista, acabam por exportar não somente um modo de vida e de consumo, mas, também, uma língua, que, nesse caso, é a língua inglesa. Sabemos que aqui, numa ex-colônia europeia do sul global, sofremos as injustiças e desigualdades intrinsecamente ligadas às explorações e abusos do sistema em que vivemos. Devemos, portanto, nos opormos a tudo aquilo que é anglófono, rejeitando a língua do capitalismo e dos grandes burgueses do mundo? Na minha concepção, certamente não.

            Ainda que nos oponhamos ao modo em que isso se deu, ignorar o fato de que o Inglês é uma língua internacional é isolar-se do que está dado; das antíteses e sínteses sociais que nos trouxeram onde estamos hoje. É ignorar as possibilidades que uma das Línguas Estrangeiras mais faladas no mundo pode nos ofertar; e, acima de tudo, é perder a oportunidade de nos comunicarmos com povos que também sofrem as mesmas opressões e as mesmas injustiças desse complexo sistema social, político e econômico que vivemos. A indignação, quando coletiva, ecoa mais forte. Apesar de ser uma ferramenta extremamente atrelada ao colonialismo, ao imperialismo e às muitas mazelas que vivenciamos hoje. Ao aprendermos o Inglês, passamos a ser capazes de nos comunicarmos internacionalmente, subvertendo tudo aquilo que nos fora empurrado goela abaixo por meio um estridente grito conjunto de transformação. É hora de nos apropriarmos dessa ferramenta; afinal, está mais do que na hora de falarmos e de agirmos contra aquilo que nos aflige como indivíduos, sociedade e mundo.

*Foto descrição: Mapa do norte da Europa, contendo o norte da França, da Alemanha, a Dinamarca, a Grã-Bretanha e a Irlanda. Acima da Alemanha está escrito: Modern countries are shown in green / Germany; acima da frança, está escrito France. Na Grã-Bretanha, temos England ao leste, Wales ao oeste e Scotland ao norte; em cima da ilha está escrito “Britain”. Na ilha à esquerda está escrito “Ireland”. Em cima da Dinamarca, em preto, está escrito “Saxons / Angles / Jutes”. No meio, há o North Sea e setas indicando da dinamarca para a Grã-Bretanha; entre essas setas está escrito “Germanic invasions of the 5th century”. No canto inferior direito, há uma seta para cima, apontando o Norte, e o texto “EnglishClub.com”.

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Xenofobia: um tema a ser discutido e uma realidade a ser combatida!

18/05/2021 11:48

Andréia Gomes Araújo,
Bolsista PET Letras
Letras Português

Nos últimos meses, o tema da xenofobia voltou com força à pauta de discussões entre os brasileiros, o reality show Big Brother Brasil (BBB) foi um dos principais gatilhos para que isso ocorresse. Com isso, a página do Instagram “Quebrando o Tabu” reforçou esse diálogo entre o programa e o que acontece com os brasileiros que moram no nordeste do país, nesse caso. Isso foi intensificado com a presença de uma nordestina, paraibana e campinense, na casa mais vigiada do país.

Mesmo que não você não assista ao programa, é provável que de alguma forma esteja por dentro dos últimos acontecimentos do reality. Pouco depois do início do BBB21, Juliette Freire tornou-se o centro das atenções fora da casa, principalmente, por ter que enfrentar a xenofobia. Além das várias outras atribuições positivas, que o povo brasileiro viu nela, as quais não trataremos aqui, a questão do enfrentamento da xenofobia e, por sua vez, da valorização da cultura regional ganhou força.  Em uma das ocasiões, a campinense chama a casa para conversar e diz que está se sentido excluída e que percebe que é por ser nordestina. Em alguns momentos, ela foi ridicularizada pelo seu sotaque, alguns chegaram a imitá-la, confirmando a xenofobia — ainda que alguns discordem, não há outro nome coerente para isso. Juliette gritava do seu jeito para dizer a nós, brasileiros, que ela estava sendo vítima de preconceito dentro da casa.

Fonte: Imagem de Instagram *

É importante chamar atenção para a palavra xenofobia, que em alguns dicionários significa aversão, hostilidade e ódio ao estrangeiro, pois, se pararmos para pensar, entendemos que estrangeiro, na verdade, acaba sendo alguém estranho, aquele que não partilha das características de certo grupo social e, não, necessariamente, alguém de outro país. Assim, a xenofobia pode ser entendida como o conjunto de ações em relação à origem das pessoas.

São diversas as ocasiões em que o nordestino é vítima de ódio por pessoas de outras regiões do país, por exemplo. As redes sociais e os jornais televisivos, por exemplo, estão aí para mostrar essa infeliz realidade, a qual foi intensamente pontuada no BBB21. O programa, embora seja de entretenimento, tem sido importante para trazer à tona diversas discussões sobre o humano e suas relações sociais. As reflexões servem não apenas para que os participantes percebam como agem com os outros a sua volta, mas, também, para que aqueles que assistem ao BBB se percebam em cada participante e atentem para os temas que estão sendo problematizados e discutidos, já que, às vezes, o preconceito está tão enraizado e banalizado que consideramos o ato de rir, imitar e/ou ridicularizar o outro por suas origens culturais e sociais como uma ação natural.

Nós, seres humanos, estamos em um posição privilegiada em relação às outras espécies no que se refere a nossa capacidade de reflexão consciente diante de problemas que precisam ser enfrentados. Vivemos em meio a um universo diverso, onde, cada vez mais, as migrações e o intercâmbio de culturas ganha espaço e se intensifica. Frente a isso, precisamos aprender a conviver e ter comunhão com as diferenças de origem daqueles que estão à nossa volta e não agredir, ferir, rejeitar, excluir e/ou prejudicar ao outro, por exemplo, pelo simples motivo de ele não ser igual a você.

Atualmente, não só a xenofobia ameaça a nossa integridade física e mental, mas diversas outras ações racistas, homofóbicas, discriminatórias, preconceituosas que existem ao nosso redor. Pense nisso! Posicione-se e lute em prol do respeito às diferenças e combata toda e qualquer forma de discriminação! Faça ao outro, apenas, aquilo que você gostaria que fizessem com você!

*descrição da imagem: Na imagem Juliette Freire posa para foto de lado com os braços cruzados, segurando um triângulo. Veste uma roupa preta e chapéu típico da paraíba. Ela tem cabelos longos e lisos e a pele clara.

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“Crip camp” e as revoluções pela inclusão: questão de pertencimento

11/05/2021 19:06

Ana Maria Santiago,
Bolsista de Acessibilidade – PET-Letras
Letras Português

Imagine ser um adolescente com deficiência e, principalmente por isso, sempre se sentir diferente. E errado, também, por ser e estar diferente nesse mundo onde você e o seu corpo simplesmente não parecem caber. Ter que lidar com a falta de apoio, informação ou mesmo com o vazio de sentir que não havia possibilidades, o direito mais básico. Imagine, então, de repente ir para um lugar com outras pessoas e sentir que elas finalmente são como você. E ser ouvido e ouvir também, como se fora dali sempre tivesse sido assim. Contudo, saber o tempo todo que não é assim. Foi um pouco dessa forma, dadas as devidas proporções, que me senti assistindo “Crip Camp, Revolução pela Inclusão”, na Netflix.

O documentário, produzido pela produtora de Michelle e Barack Obama, mostra a história de um acampamento de férias para jovens com deficiência que ocorreu nos Estados Unidos de 1951 a 1977, o Camp Jened, e o enorme impacto que esse espaço teve nos campistas, monitores e na sociedade em geral. Mas como este é um texto nada técnico, vou me concentrar em falar das subjetividades, pois, afinal, são elas que nos constroem. Se quiser saber mais detalhes dos acontecimentos, assista ao documentário, que conta com recursos de audiodescrição e Closed Caption. Aliás, se esse texto puder ser um apelo, por favor, assista.

Fonte: Imagem do documentário da Netflix na Internet.*

Logo no começo, são mostradas imagens e entrevistas antigas de alguns campistas e monitores, além de relatos mais atuais deles sobre o acampamento. Ainda era só o começo e eu já estava chorando. As palavras deles tocavam em um lugar em mim, ao mesmo tempo difícil e ridiculamente fácil de explicar. Eu entendia aquelas histórias em um nível diferente, mais íntimo e real. Eu entendia e reconhecia esses como lugares em que já estive ou ainda estou. Eu sei como é se sentir desacreditada o tempo todo. Sei como é quando até as pessoas próximas — às vezes, especialmente elas — duvidam de mim. Sei das dores e da solidão de não se encontrar em ninguém e nem encontrar espaços onde caber. Sei das portas imediatamente fechadas e das que nem achamos que podemos tentar abrir. Sei do lugar vazio de “exemplo de superação”, em que nos colocam, e de como é solitário e ilusório estar lá. Sei como é sair. E, naquele momento, ouvindo essas pessoas, senti que compartilhávamos algo. Algo potente, ali exposto e escancarado, para todo mundo ver. Foi o tamanho dessa potência que me levou às lágrimas e essa foi a primeira de muitas vezes em que isso aconteceu.

Ao falar do acampamento, as pessoas transmitiam um sentimento que também me atingiu em cheio no peito. O pertencimento. A liberdade de ser quem realmente somos e de não se preocupar se seremos aceitos. O respeito de ser ouvido de verdade. No Camp Jened, pessoas com diferentes deficiências e monitores sem deficiência conviviam sem ter que esconder seus corpos ou particularidades, encontrando formas de receber e, também, de dar ajuda e cuidado uns aos outros sempre que necessário. Inclusive aprendendo juntos a encontrar esse coletivo. Ninguém era um problema. Ninguém ficava para trás. Uma das cenas que me tocou especialmente foi a de uma das reuniões que eles faziam para decidir coisas cotidianas, em que todos se pronunciavam. Em certo momento, uma moça com deficiência física falava lentamente e todos ouviam. Quando alguns não conseguiram entender, outros tentaram ajudar. Tudo com o respeito que deveria ser a regra, mas que não é. Aquilo me chamou a atenção, principalmente, por várias vezes, já ter presenciado as pessoas — o tempo todo — atropelando e tentando adivinhar o que pessoas com deficiência tentavam dizer sem deixá-las terminar. Como deve ser exaustivo não poder nem terminar a própria frase, não é?

Ainda falando do acampamento, pensei na minha própria busca, presente e dolorida, por formas de pertencer e também na busca por esses lugares seguros onde estar, que eu nem me dava conta de estar empreendendo por todos esses anos. Esses lugares em que eu tenho praticamente certeza de que não preciso me proteger de nada desagradável, seja em algum grupo ou com amigos, por exemplo. Pensei na sensação incrível que eles trazem e, também, no alívio imenso que representam para a minha vida. A conclusão foi óbvia e imediata: é fundamental encontrar esses lugares, ainda mais se você tem uma deficiência. Para os participantes de Crip Camp, esse lugar foi o Camp Jened. Não é à toa que foi a partir dele que surgiu, literalmente, uma revolução pela inclusão.

Era nessas reuniões, que comentei acima, que os campistas daquele grupo trocavam experiências sobre suas deficiências e realidades. Foi nesse espaço também que eles perceberam que compartilhavam de muitas dificuldades em comum e — não menos importante — que deveriam, juntos, fazer algo a esse respeito. Não só deveriam, mas poderiam e fizeram. Algo gigante. Nascia ali o que depois se tornaria o movimento político pelos direitos das pessoas com deficiência dos Estados Unidos.

O documentário mostra a articulação desses que se tornaram companheiros de luta, o que culminou em um protesto histórico em que centenas de pessoas com deficiência ocuparam um prédio do governo por mais de 20 dias pela aprovação da primeira legislação em relação às pessoas com deficiência do mundo. Só o fato de escrever isso, já me arrepia. Então nem preciso dizer que a emoção foi e ainda é grande. Por que a maioria gritante de nós nunca tinha nem ouvido falar desse protesto histórico? Outro desdobramento foi o surgimento dos primeiros Centros de Vida Independente na Califórnia e, posteriormente, em várias partes do mundo, inclusive no Brasil.

A última parte do documentário mostra alguns dos campistas e monitores retornando ao local do acampamento, então abandonado, e rememorando suas experiências e o significado desse espaço nas suas vidas. “Por que revolução pela inclusão?”; você pode ainda se perguntar. Crip Camp é revolucionário porque são as próprias pessoas com deficiência que contam a sua, a minha, a nossa história. Percebe o tamanho disso? Talvez não. Mas eu sinto na pele. As pessoas com deficiência são protagonistas e são representadas finalmente de forma inteiramente real. Crip Camp também é um trabalho incrível e, por isso, foi indicado ao Oscar de melhor documentário. Assim, na última edição do Oscar, havia uma rampa de acesso ao palco, o que não seria de surpreender se essa não fosse a primeira vez que isso acontece em 93 anos da existência do prêmio. Mas o que isso nos diz?

Crip Camp é revolucionário porque movimentou o debate sobre deficiência não só comigo mesma, mas com várias pessoas próximas, para quem também foi uma revolução de grandes deslocamentos. Porque é desses deslocamentos que fazemos tremores maiores ainda. Porque e encheu de emoção sentir a potência da identificação e ouvir as pessoas que são como eu em lugar de destaque, contando tudo aquilo que só elas e nós podemos contar. Porque mostrou para o mundo um pedaço importante da nossa história e nos fez transbordar com orgulho. Porque adicionou mais ímpeto de participarmos da luta diária. Para nós, revolucionário é, além de sermos vistos, podermos nos ver. Afinal, quem pensa que representatividade não importa é apenas quem por padrão sempre foi representado.

* fotodescrição: Cena do documentário em preto e branco, em que um homem negro, de cabelo curto e uma blusa preta sobre uma camiseta branca, carrega no colo um homem branco, de cabelos ondulados e um óculos de armação redonda. Ele veste uma calça jeans com suspensório e está sem camiseta. Ambos muito sorridentes. Ao fundo da cena aparece um homem à direita em uma cadeira de rodas e à esquerda duas mulheres sentadas, uma delas olhando para um outro homem se apoiando em uma bengala. Atrás deles árvores, um vasto gramado e uma grande casa.

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Você já teve contato com um livro bilíngue escrito em língua de sinais e em português?

07/05/2021 16:17

Stéfany Gomes Pereira,
Bolsista de Acessibilidade
Letras Libras

No Brasil, temos alguns sistemas de escrita de línguas de sinais em circulação e o mais conhecido deles é o SignWriting (escrita de sinais, em português). Talvez você ainda não saiba, mas temos alguns materiais que já circulam em escrita de sinais, como por exemplo: artigos, poesias, livros etc. Agora, temos mais um livro para incluir no rol de produções em escrita de sinais, o Florestalizando.

Fonte: imagem de arquivo pessoal*

Florestalizando é um livro bilíngue que conta a história de duas árvores surdas, abordando as relações que elas enfrentam com outras árvores e narrando aspectos da comunidade surda em sua luta por sua língua em prol de gerações futuras. O livro expressa a língua como construção social, mostrando que todos podem aprender a língua de sinais. A obra é de minha autoria e conta com a tradução para escrita de sinais brasileira da profa. Dra. Débora Campos Wanderley e está acessível para surdos e ouvintes, tanto em português quanto em escrita de sinais.

Aproveito o espaço do comunicaPET para registrar minha gratidão aos professores e às professoras dos cursos de Letras Libras da Universidade Federal de Santa Catarina que me ensinaram tanto, inclusive sobre tradução e literatura surda, incentivando-me a usar a criatividade na produção de conteúdos diversos. Nesse sentido, o Florestalizando é resultado dessa trajetória acadêmica, deixando-me orgulhosa em poder disponibilizá-lo gratuitamente a vocês, clique aqui para acessar.

 

*descrição da imagem: representação da capa do livro possui folhas com cores verde, laranja e bordo nos canto superior esquerdo e inferior direito. À direita está registrado em escrita de sinais o sinal dado ao livro e no centro escrito em português o título “Florestalizando” em maiúsculas na cor laranja. Abaixo o subtítulo, apenas com inicial maiúscula, “O conto das árvores” em cor vinho e mais abaixo, ao final dá página, temos diversas árvores com formatos variados e todas possuem olhos e algumas usam óculos. Todas estão enfileiradas de um canto ao outro e o chão sob elas é em cor vinho de um lado ao outro e no centro está escrito “1 edição” em minúsculas brancas.

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Você conhece o Hunsrückisch?

29/04/2021 09:25

Mirelle Araujo Ehrardt,
Bolsista PET-Letras
Letras Alemão

Uma das mais importantes variedades germânicas do Brasil, o Hunsrückisch representa uma herança histórica, cultural e linguística da imigração alemã para o país.

Ao analisar a fundo a constituição linguística do Brasil, é possível notar a presença de uma grande rede de pluralidade linguística, que reúne não só uma multiplicidade de línguas ancestrais dos povos indígenas, mas também línguas de origem africana e de imigração europeia e asiática, as quais colocam em xeque o mito de que o país teria apenas o português como língua única. Segundo a professora Karen Spinassé (2008) do Departamento de Línguas Modernas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, podemos destacar a onda imigratória alemã para o Brasil, principalmente durante o Séc. XIX, como importante formadora da pluralidade linguística e cultural do país, bem como a herança linguística deixada por ela como valiosa para as diversas comunidades que ainda preservam essas variantes como língua materna.

Fonte: Realiza, 2019*

Diversos fatores, como o grande índice de desemprego, péssimas condições de vida, além de conflitos religiosos e políticos na Europa do século XIX, bem como a crise dos estados alemães, ainda antes da unificação nacional, levaram uma massa de pessoas a buscar uma possibilidade de mudança nas colônias brasileiras. Assim, os imigrantes alemães foram levados principalmente à região sul do Brasil, local até então pouco povoado, onde formaram pequenas comunidades praticamente isoladas que utilizavam, sobretudo, a língua dialetal dos estados alemães.

Nesse sentido, é importante lembrar que o alemão padrão que conhecemos hoje ainda não existia nessa época, visto que os estados alemães ainda não haviam se unido. Por isso, as diferenças entre os dialetos eram ainda mais perceptíveis do que hoje. Dessa forma, esses dialetos foram trazidos ao Brasil e entraram em contato linguístico direto uns com os outros, com o português e outras línguas de imigração, o que originou várias outras variantes, como o westifaliano e o pomerano, por exemplo.

Foi esse também o caso do Hunsrückisch, uma variante originária do dialeto alemão conhecido como francônio-renano ou francônio-moselano, falado pelos imigrantes que vieram sobretudo da região de Hunsrück, no sudoeste da Alemanha. Atualmente, o Hunsrückisch pode ser encontrado em comunidades da região sul, em Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Paraná, bem como em algumas cidades do interior do Espírito Santo. Nesse sentido, apesar de manter a estrutura do alto-médio alemão e de apresentar um corpus de origem germânica, o Hunsrückisch, ao incorporar influências do português e possuir seu processo de formação único, é considerado uma língua brasileira, bem como patrimônio cultural imaterial nacional.

Entre os exemplos de fenômenos linguísticos que ocorrem no Hunsrückisch, podemos citar a mudança de pronúncia de oclusivas sonoras ([b],[d],[g]) para surdas ([p],[t],[k]), como em Bruder = Pruder, Durst = Torscht, Blätter = Blädder. Esse fenômeno acontece também nos empréstimos do português usados no lugar de palavras em alemão, como em o gato = der Kato, o cabide = der Gabide. Muito interessante, não? Outros exemplos podem ser encontrados no Inventário do Hunrückisch como Língua Brasileira de Imigração (IHLBrI), desenvolvido pelo Projeto ALMA-H (Atlas Linguístico-Contatual das Minorias Alemãs na Bacia do Prata: Hunsrückisch) em parceiria com o IPOL (Instituto de Investigação e Desenvolvimento em Política Linguística). Para saber mais sobre o Hunsrückisch, assista aos vídeos:

Fonte: MOPC – Linguística. Riograndenser Hunsrickisch – O Alemão Brasileiro. 2019.

Fonte: Documentário: Viver no Brasil falando Hunsrückisch. Direção: Gabriel Schmitt e Ana Winckelmann. Roteiro: Ana Winckelmann e Gabriel Schmitt. Edição e montagem: Alice Soares. 2019.

 

Referência:

SPINASSÉ, Karen Pupp. O hunsrückisch no Brasil: a língua como fator histórico da relação entre Brasil e Alemanha. Espaço Plural. 2008, IX(19), 117-126 [acesso em 28 de março de 2021]. ISSN: 1518-4196. Disponível em: https://www.redalyc.org/articulo.oa?id=445944361013

*Descrição da imagem: imagem de uma rua de paralelepípedos na Serra Gaúcha, que segue em direção a uma torre com uma passagem em arco por baixo. A calçada, também de paralelepípedos, fica no mesmo nível da rua, em um tom mais claro de cinza. À esquerda, uma casa de segundo andar azul claro, com uma pequena árvore de natal com bolas de enfeite em frente às escadas. Do outro lado da rua, à direita da imagem, encontram-se, lado a lado, casas de dois andares com arquitetura germânica e telhado em forma triangular de variadas cores, respectivamente verde claro, amarelo, rosa e branco. O céu aparece ao fundo, praticamente sem nuvens, em um degradê suave de branco para azul claro.

Você sabe o que são os Sinais Internacionais usados pelos surdos?

22/04/2021 12:51

Daniel Guilherme Gonçalves,
Bolsista PET-Letras
Letras Libras

Antes de falarmos dos Sinais Internacionais, é importante dizer que existem diversas línguas de sinais no mundo e que, inclusive, um mesmo país pode ter mais de uma língua de sinais. Portanto, a língua de sinais não é universal, assim como ocorre com as línguas orais que conhecemos. Entretanto, os povos surdos de diferentes países que não compartilham uma mesma língua de sinais têm utilizado para se comunicar uma “língua de sinais mundial” conhecida como Sinais Internacionais (SI) — em inglês International Sign.

Portanto, o sistema de Sinais Internacionais tem permitido que surdos sinalizantes de distintas línguas de sinais estabeleçam a comunicação e se compreendam em contextos multilíngues, assim como em viagens internacionais. Cada vez mais, os encontros internacionais e os eventos acadêmicos têm optado pelo uso dos Sinais Internacionais como se fosse uma “língua franca”. Mas, enfim, o que são os Sinais Internacionais?

Fonte: Granado, 2019*

Segundo a Federação Mundial de Surdos — World Federation of the Deaf (WFD) — os Sinais Internacionais não são uma língua, mas, sim, um conjunto de convenções usadas em eventos internacionais, esse sistema usa estruturas icônicas juntamente com o uso de sinais de mais de uma língua de sinais. Para alguns pesquisadores, o sistema de Sinais Internacionais é comparável a um pidgin, sendo um exemplo de translinguagem ou de comunicação cross-linguística. Entretanto, por não possuir um léxico fechado nem um sistema fixo de regras, os Sinais Internacionais não podem ser comparados ao Esperanto nem ao Gestuno. O Gestuno é um sistema artificial padronizado de sinais que foi usado sem êxito na década de 1970 pela WFD, juntamente com a Associação Britânica de Surdos, na tentativa de criar uma “língua de sinais internacional”. É interessante mencionar que encontramos algumas variações do sistema de Sinais Internacionais, já que ele depende do contexto social dos sinalizantes, de sua cultura, de sua língua de sinais, de seu perfil etc. Para conhecer mais sobre o tema, você pode acessar o FAC (Respostas às Perguntas Frequentes) feito pela WFD clicando aqui. Assista abaixo um vídeo em sinais internacionais.

Fonte: WFD**

A WFD começou a adotar os Sinais Internacionais em seus congressos internacionais, a partir de 1987. Desde então, os Sinais Internacionais passaram a ter lugar em diferentes países nos encontros e eventos internacionais envolvendo sinalizantes de diferentes línguas de sinais. No Brasil, é comum vermos os Sinais Internacionais sendo empregados em congressos e encontros internacionais, inclusive temos tradutores e intérpretes, surdos e ouvintes, que oferecem serviços de tradução e de interpretação da Libras para os Sinais Internacionais e dos Sinais Internacionais para a Libras.

* descrição da imagem: Globo terrestre ao centro em preto e branco com três blocos de textos à direita e três blocos de textos à esquerda desalinhados em diferentes sentidos. À direita, de cima para baixo: primeiro bloco – GESTUNO? / British Deaf Association, 1975; segundo bloco – Língua Internacional de Sinais? / Campello, 2014; terceiro bloco – PIDGIN? / Supalla & Webb, 1995; Moody, 2008. À esquerda, de cima para baixo: primeiro bloco – Cross-Signing? / Zeshan, 2015; Byun de Vos, Bradford, Zeshan, Levinson, 2017; segundo bloco – Língua Franca? / Hansen, 2016; terceiro bloco – Internacional Sign? / Mesch, 2010; WFD, WASLI, 2016.

**  descrição do vídeo: Presidente da WFD, Joseph Murray — homem branco, careca, de barba curta e grisalha — vestindo um terno cinza sobre uma camisa branca e um gravata listrada diagonalmente nas cores vinho e prata e sinalizando em Sinais Internacionais em um sala com um móvel antigo de fundo e um vaso com flores brancas.

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“O Silêncio dos Homens”: uma reflexão sobre masculinidade

14/04/2021 11:19

 Felipe Mateus dos Santos,
Bolsista PET – Letras
Letras Português

Ao longo da história, o gênero masculino foi, e, infelizmente, ainda é associado à noção biológica de sexo masculino. O conceito do ser masculino segue relacionado à certa natureza animal, contribuindo para construção de diversos valores que permeiam a virilidade, a falta de afetividade, a noção de provedor do lar, dentre outros valores patriarcais impostos à figura do homem. De acordo com Pierre Bourdieu, em sua obra O Poder Simbólico (1989), ao serem naturalizados com o passar do tempo, esses valores cumprem a função política de instrumentos de imposição ou de legitimação da dominação dos homens para com os demais gêneros. Dessa maneira, temos que masculinidade diz respeito a um conjunto de diversas práticas de poder em torno da posição dos homens na estrutura das relações de gênero de uma sociedade.

Dentro desse sistema criado e estabelecido até os dias de hoje, fez-se necessário um esforço recente de diversos grupos — de diversos caráteres e com diversas composições — que começaram a se organizar em prol de promover a reflexão sobre os direitos humanos, a cidadania, a democracia, a busca pela paz entre as sociedades e a igualdade entre os gêneros, na tentativa de romper, ainda que aos poucos, essas concepções sobre o ser masculino.

O Silêncio dos Homens”, é uma dessas tentativas de mudança neste cenário, um documentário lançado em 2019, produzido pela plataforma Papo de Homem, na tentativa de compreender e reverter os motivos pelos quais os homens deixam de expor e compartilhar seus sentimentos, ocasionando em diversos problemas como violência doméstica, assédio, altíssimas taxas de suicídio, homicídio, mortes no trabalho, encarceramento em massa dos homens, dentre outros problemas que afligem a sociedade como um todo.

Fonte: Portal Papo de Homem, 2019*

Neste documentário, são levantadas diversas informações, dados e relatos de pessoas a respeito de como essa construção machista e patriarcal afeta diretamente a vida de homens e mulheres, de crianças e adolescentes, e busca incentivar a abertura emocional e sentimental.  De acordo com a obra, diversas iniciativas são organizadas em todo país a fim de fomentar a criação de reuniões e grupos de homens com o objetivo de compartilhar sentimentos e experiências em torno do gênero masculino e de suas construções e assim ressignificá-las. Enfim, esse é um movimento de coragem, coragem para assumir responsabilidade, para escutar as mulheres, para que os homens sejam sensíveis e se ajudem a construir vidas melhores.

Algumas iniciativas mencionadas no documentário podem ser acessadas a seguir:

Assim como os movimentos feministas, os movimentos de reflexões sobre masculinidades, tornaram-se uma importante luta pela igualdade social e de gêneros. Cada grupo formado, cada roda de conversa e cada espaço de manifestações em prol desse rompimentos de construções machistas e patriarcais é de extrema importância para o progresso em direção a uma convivência harmoniosa na sociedade como um todo. A criação de documentários e de plataformas de produção de conteúdo crítico são fundamentais na promoção dessa igualdade.

*Fotodescrição: Imagem de um grupo de homens sentados em semicírculo, acomodados em carteiras, conversando entre si. Ao fundo, uma parede branca com uma janela e outra com uma pintura de um sol.

Tags: comunicaPET

Mini resenha literária: romance Torto arado, de Itamar Vieira Júnior

05/04/2021 12:35

Moara Zambonim,
Bolsista PET-Letras
Letras Português

“Mesmo com toda a adversidade, é preciso que a gente tenha essa esperança engajada”,
diz Itamar Vieira Junior

Foto do livro “Torto Arado” – Arquivo pessoal

Vencedor de diversos prêmios, como o LeYa 2018 e o Jabuti, a obra Torto Arado provoca um arrebatamento em quem a lê. De repente, o leitor não se encontra mais em seu sofá na sala: ele vê passar ao seu redor as paisagens do sertão baiano, do coração da chapada, e as personagens estão ali também, figuras — a maioria feminina — que inspiram sabedoria, compaixão e um senso de justiça aguçado.

A partir de um acontecimento na infância, nos é narrada a história das irmãs Bibiana e Belonísia, e também de toda sua linhagem familiar, valendo-se o autor de trocas de foco narrativo, o que inclui a voz de entidades maiores, para contar eventos do passado e suas consequências no futuro.

A sutileza da escrita é tamanha que as mazelas sociais protagonizam a história sem serem óbvias, delineando-se de tal forma que o leitor as constrói como mais uma das incríveis personagens femininas que compõem a narrativa; pois são as mulheres que são centrais na obra, em tramas familiares imbricadas e em ciclos que se repetem entre gerações. A construção dos heróis está repleta de nuances de gênero, de construção de subjetividades raciais que permeiam gerações atreladas a um passado escravista que se costura até a realidade.

Em matéria publicada pela Revista Época, a neta de Euclides da Cunha faz o seguinte comentário: “Exclusão relatada em Os Sertões está presente até hoje”. E é interessante pensar como uma temática literária de mais de 100 anos atrás — depois retomada por Graciliano Ramos, João Cabral de Melo Neto e outros, como Raduan Nassar, cuja voz se faz presente na epígrafe do romance — volta, hoje, com representação impecável. Representação que foge de estereótipos e compõe uma visão do sertão precisa e profunda, que infelizmente conversa ainda com textos tão antigos e composições literárias que se estendem até a atualidade.

Eu, particularmente, não consegui largar a leitura: em dois dias, havia finalizado o livro e ficado com uma sensação de “quero mais”. E essas populações invisibilizadas que se apresentam a nós mantêm-se na memória de quem lê.

Vale muito a pena a leitura! Ficção nacional que chega a mais de 100 mil exemplares vendidos, o livro foi primeiramente publicado em Portugal e apenas depois a editora Todavia adquiriu os direitos da obra e a publicou aqui, para nossa sorte. Então, quem precisava de ainda mais um incentivo para ler esse romance, deixo aqui minha recomendação!

 

*descrição: Foto do livro “Torto Arado” no meu colo, aparecendo apenas a ponta dos meus joelhos, com um caderno de couro vegano marrom atrás do livro. O título está em vermelho e a capa do livro é rosa clara e, ao centro, vemos a ilustração de duas mulheres negras de mãos dadas. Nas outras mãos, carregam folhas da planta “espada-de-São-Jorge”, compridas em verdes claro e escuro. Elas levam turbantes coloridos na cabeça e suas roupas são em tons pasteis, combinando com a cor da capa.

 

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