Jogos no ensino-aprendizagem de Língua Estrangeira
Camila Vicentini Camargo,
Bolsista PET-Letras
Letras Italiano
Você alguma vez já estudou uma língua estrangeira (LE) — ou qualquer outra matéria — por meio de jogos e dinâmicas em sala de aula? Posso apostar que quando criança, sim. Mas hoje estamos tão acostumados/as com aulas expositivas que, às vezes, quando o/a professor/a propõe algum jogo ou dinâmica diferente, questionamos se aquilo vai realmente nos ajudar no aprendizado ou se é apenas um passatempo, algo para deixar de lado o conteúdo e relaxar.
Durante um semestre letivo, a depender da proposta e do plano de ensino, nem sempre há tempo para a realização de tais atividades, ainda mais se pensarmos o jogo como algo extra, a ser aplicado “apenas se der tempo”. No entanto, um jogo pode muito bem substituir toda uma aula expositiva, se for bem planejado, e assim o conteúdo da aula é passado apenas através do jogo. Pode ser uma dinâmica de apresentação do conteúdo, para introduzir o que será estudado na sequência didática, por exemplo. Pode também servir para consolidar os conhecimentos já adquiridos, como uma dinâmica de revisão. São muitas as possibilidades.
Mas de que jogos, de fato, estamos falando? Como esses jogos podem ser aplicados para uma turma de LE?
Antes de tudo, um jogo, entendido como atividade majoritariamente coletiva, se baseia num conjunto de regras e desenvolve a perspectiva do lúdico nas pessoas. Possui tempo e espaço próprio para ser realizado e permite que seus/suas jogadores/as tenham liberdade, ainda que apoiados/as nas regras. O jogo está sujeito a muitos significados e sentidos e também se relaciona diretamente ao contexto sociocultural — costumes, normas e padrões — do qual os indivíduos fazem parte.
Podemos, aqui, pensar em algumas classificações de jogos em geral para que possamos compreender quais jogos e tipos de jogos melhor funcionam no ensino-aprendizagem de LE e como podem ser aplicados em sala de aula, seja no ensino presencial ou remoto. Importante ressaltar que determinados jogos funcionam melhor em determinados contextos e isso deve ser observado pelo/a docente para que o jogo atinja seu objetivo pedagógico.
Vamos às classificações determinadas por Retondar (2007):
- Jogos de competição: atividades competitivas em que os/as participantes se encontram em situações igualitárias e há um/a vencedor/a. Ex.: competições esportivas.
- Jogos de acaso: atividades em que predominam o acaso, a sorte, o destino e em que não se faz uso de qualquer habilidade previamente adquirida; aqui o/a jogador/a atua passivamente. Ex.: roleta, bingo, loterias.
- Jogos de imitação: jogos fictícios em que o/a jogador/a adota um papel para si; atividades em que não existem submissão a regras; jogos protagonizados. Ex.: teatro; imitação; mascaramento.
- Jogos de vertigem: jogos em que se destrói a estabilidade de percepção do corpo humano e em que se busca atingir algo como transe, espasmo, afastamento da realidade. Ex.: giros, volteios, trocas de direção.
Além das classificações de Retondar (2007) analisadas, também, por Grillo e Prodócimo (2017), poderíamos acrescentar outras duas categorias, bastante significativas para a área de jogos e dinâmicas no ensino de LE, que vemos a seguir:
- Jogos de cooperação: dinâmicas de grupo que promovem a cooperação, o espírito de equipe e a ajuda mútua entre os/as integrantes; se desenvolve uma série de habilidades cognitivas e socioemocionais nos/as participantes. Ex.: telefone sem fio.
- Jogos sensoriais: jogos que trabalham com um ou mais dos sentidos: tato, audição, visão, paladar e olfato; estimulam a imaginação; desenvolvem habilidades e permitem ao/à participante interagir com seu entorno. Ex.: estátua (entre outros jogos com música), jogos em que se deve, de olhos vendados, descobrir um objeto usando apenas o tato, por exemplo.
Fonte: Montagem feita pela autora a partir de imagens retiradas da internet.*
Alguns jogos podem ser elencados em mais de uma categoria, por exemplo, cooperação + competição (como vários esportes jogados em equipe); imitação + acaso (como jogos de improviso teatral, por exemplo, em que se deve interpretar a partir dos comandos ditados por terceiros ou de uma carta tirada na hora).
No ensino de língua estrangeira, podem ser trabalhados jogos como Stop (competição); Complete a história (cooperação); Jogos com dados (acaso); Descreva o objeto (sensorial); Adivinhe o personagem (imitação); etc.
Jogos de vertigem, ainda que menos comuns para uma aplicação em sala de aula, poderiam ser adaptados, numa situação guiada, por exemplo, em que se tenha um/a participante que diga, na língua estrangeira, que movimentos corporais os outros devem fazer, para atingir determinado objetivo.
Com tantas possibilidades, e como já dito anteriormente, é interessante observar o contexto de aprendizagem dos/as estudantes e delimitar os objetivos pedagógicos para a realização dos jogos e, claro, planejar e explicar muito bem as regras para que não haja dúvidas durante a atividade e não se prejudique o desempenho dos/as participantes.
Se a ideia é revisar o conteúdo, por exemplo, você pode propor um jogo de competição, de tabuleiro, em que o/a aluno/a que acertar a resposta avança uma casa; ou um jogo de cooperação, em que cada grupo deve ordenar as frases para finalizar a história. Se a ideia é introduzir o conteúdo, você pode propor um jogo de adivinhação ou de associação, por exemplo, em que as equipes devem relacionar as palavras sugeridas à imagem apresentada. Essas são apenas algumas sugestões. É possível misturar as categorias e criar um jogo totalmente novo ou aproveitar jogos tradicionais como caça-palavra, stop, forca, trava língua, quebra-cabeça, e tantos outros.
A dica que posso dar, com base nas experiências que tive como aluna e professora, é não ter medo de experimentar, mas, também, não ir com muita sede ao pote. Na dúvida, realize jogos mais simples ou mais rápidos, no início, para ir sentindo a resposta da turma e ir adaptando as dinâmicas da melhor forma possível. Com o tempo vamos ganhando segurança para propor as diferentes atividades com as quais não éramos acostumados/as antes e, assim, conseguimos facilitar uma transformação no ambiente do/a estudante e uma ampliação de suas habilidades linguísticas.
Referências:
RETONDAR, J. J. M. Teoria do jogo: a dimensão lúdica da existência humana. Petrópolis: Vozes, 2007.
GRILLO, R. de M.; PRODÓCIMO, E. Teoria do jogo: a dimensão lúdica da existência humana. Conexões, Campinas, v. 15, n. 2, p. 251-256, 2017.
*fotodescrição: Montagem com seis imagens. No canto superior esquerdo, há uma pessoa pegando fichas azuis e laranjas que estão dispostas sobre três mesas. No centro superior, peças quadradas e pequenas de madeira, com letras pretas carimbadas, empilhadas sobre um tabuleiro quadriculado. No canto superior direito, um bloco de caça-palavra, com letras variadas e embaralhadas, dispostas em colunas. No canto inferior esquerdo, um desenho do jogo da forca, com um boneco palito pendurado por uma estrutura, como se estivesse enforcado. No centro inferior, há duas mãos sobre um jogo de tabuleiro. Uma segura um dado e outra segura um peão amarelo. O tabuleiro possui linhas traçadas e coloridas que cada peão deve seguir. No canto inferior direito há quatro estudantes escrevendo com giz sobre um quadro negro. Cada estudante está completando uma coluna da tabela do jogo Stop. Outros estudantes sentados acompanham a escrita.