“Manhãs de Setembro”, um retrato necessário.

14/07/2021 20:28

Mayumi Motta Esmeraldino,
Bolsista PET Letras
Letras – Francês

A nova série da plataforma digital Amazon PrimeManhãs de Setembro” estreia a cantora Liniker nas telas cinematográficas e nos envolve em um retrato sensível de uma realidade brasileira ainda muito velada.

Cassandra (Liniker) é a personagem central da trama e nos apresenta uma mulher trans em busca da realização de seus sonhos na grande capital de São Paulo. Tudo parece estar percorrendo caminhos de avanço na vida da personagem, até que uma surpresa inesperada bate à sua porta: Leide (Karine Telles), mulher com quem Cassandra envolvia-se antes da transição de gênero e Gersinho (Gustavo Coelho), o filho de dez anos que Cassandra não sabia existir.

Fonte: Imagem da Internet*

Entre um relacionamento às escondidas e a carreira de cantora, Cassandra passa a viver um conflito que poderia ser típico de qualquer heroína: como controlar o incontrolável? Enquanto persiste na realização de seus sonhos e nega qualquer conexão afetiva com Gersinho, o menino busca incessantemente no ‘’pai’’ o amor e afeto que a vida carente não lhe permite encontrar. Apesar de muitas escolhas falhas, que se tornam justificáveis ao espectador, uma vez que as alternativas são escassas, Cassandra parece ativar (inconscientemente) um “instinto materno” com a aproximação inevitável do filho. A partir daí, em apenas cinco episódio, a trama nos surpreende fugindo das vias óbvias de roteiro nos trazendo personagens comuns da vida real, mas igualmente singulares e complexos.

Assim também se destaca Leide, que traz uma outra perspectiva da mesma história, tão dura quanto a de Cassandra. A vida da mãe solteira, pobre, sem amparo social, sem recursos, que por vezes se mostra imoral, mas que luta incessantemente pela sobrevivência de si e de seu filho. A personagem traz uma outra perspectiva da mesma história e se assemelha à Cassandra quando, por vezes, sem mostra também imoral, sem enquadrar-se no senso comum de “boa mãe’’.

“Manhãs de Setembro” vai muito além de visibilizar a dura realidade da mulher trans, preta e pobre no Brasil, ou da mãe solteira sem qualquer rede de apoio que sofre a pressão social de ser uma super heroína. A série retrata a vida de duas mulheres que, com todas as suas diferenças, lutam em igual perseverança contra as inúmeras adversidades de uma vida nada privilegiada. Cassandra e Leide inspiram encontrar algo a mais, algo que dê sentido à vida, algo que as permita ser quem simplesmente são, algo que parece não lhes ser permitido ter: a liberdade. Assim, com seus caminhos tortos cruzados, os personagens da série encontram entre si a afetividade do amor em todas as suas formas, nas mais puras e nas mais profanas, que não parecia ser possível existir em uma vida tão cinza mas também tão viva.

* Fotodescrição: Imagem com fundo desfocado onde há uma parede de tecidos cintilantes cor de cobre dependurados e um guitarrista sentado olhando para baixo enquanto toca a guitarra. Ao centro da imagem, em foco, uma mulher trans preta (personagem Cassandra) de cabelos cacheados cor de cobre presos em um coque meio solto. Ela veste uma blusa preta de mangas longas e segura um microfone à sua frente, cantando de olhos fechados.

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