DE FÉRIAS COM O PET | A figura feminina no conto “O Caso de Rute”, de Júlia Lopes de Almeida

22/01/2024 10:20

Por Izabel Bayerl Bonatto

Letras-Português

Bolsista PET – Letras

 

O conto O Caso de Rute, publicado em 1903, está presente na coletânea de contos Ânsia Eterna, que foi escrita por Júlia Lopes de Almeida, e tem como ponto central o entrelaçamento entre a pureza e a violação. A autora apresenta no conto traços do Romantismo, apesar de pertencer ao Realismo, além de trazer elementos góticos para o texto, dando voz à personagem feminina Rute, abordando criticamente a questão do casamento arranjado e questões sociais relevantes para a época na qual o conto foi escrito.

Descrição da imagem: o fundo da foto é todo num tom de roxo azulado; na parte superior está escrito na cor branca “O caso de Rute” e abaixo na cor preta “Júlia Lopes de Almeida”. No canto inferior direito há uma imitação de pagina rasgando que revela a parte de trás da cabeça de uma mulher branca de cabelos escuros.

É contada a história de Rute, uma mulher branca de 23 anos e de boa classe social, que está prometida como noiva para Eduardo Jordão; porém, a jovem guarda um grande segredo. Logo que Ruth é apresentada a seu noivo, a baronesa Montenegro começa a tecer elogios sobre o quanto a moça é bondosa, recatada, digna, instruída e de boa educação. Toda essa apresentação acerca da jovem remete ao que a sociedade esperava da figura feminina na época, uma mulher passiva e servente do marido e família. “[…] Eram, com isso, apagadas, no sentido de que sua subjetividade era completamente desconsiderada em função do outro, o sujeito masculino, e em função de manter os status quo daquela sociedade” (Dias, 2019, p.150).

Outro ponto a ser destacado ocorre na história assim que Rute fica a sós com Eduardo e ela revela que não quer enganá-lo, afirmando que não é mais “pura”: “– Eu não sou pura! Amo-o muito para o enganar. Eu não sou pura!” (O Caso de Rute, p.30). Ela descreve o ocorrido: há 8 anos seu padrasto, já falecido, dominava-a; a vontade dele era a mesma da dela. Ao mesmo tempo que ela lastima o ocorrido, também não se absolve de sua culpa e em nenhum momento diz ter lutado contra aquilo: “– É isto a minha vida. Cedi sem amor, pela violência; mas cedi.” (O Caso de Rute, p.31). É possível notar que a personagem espera que Eduardo cancele o noivado e a culpe por não ser mais virgem, mas não é o que acontece. Ele perdoa Rute mesmo sem ela ter pedido esse perdão.

Neste ponto da história ocorre uma espécie de fluxo de consciência de rapaz, seus pensamentos travam uma batalha entre a violência que acabara de descobrir, a morte do padrasto dela e o amor que há entre os dois. Além disso, agora perdoada e com o casamento ainda prometido, ocorre outro fluxo de consciência, mas agora de Rute: o perdão de Eduardo a revoltava, e ela ponderava sobre a possibilidade dele a repelir no futuro, mesmo ele prometendo que esqueceria do ocorrido. Com isso, vieram à sua mente pensamentos suicidas:

Rute pensou em matar-se. Viver na obsessão de uma ideia humilhante era demais para a sua altivez. Desejou então uma morte suave, que a levasse ao túmulo com a mesma aparência de cecém cândida, de envergonhar a própria sensitiva. (O Caso de Rute, p.33)

E realmente a protagonista cumpre com seu desejo, suicida-se. Em seu velório, uma mesma voz repetia que a jovem iria ficar com o falecido padrasto, no mesmo jazigo. Eduardo, pensando que a noiva havia se matado para ir de encontro com o antigo amante, teve um surto de ciúmes somado ao sentimento de posse, tal como Rute sabia que em algum momento aconteceria: “E a todos que acudiram nesse instante pareceu que viam sorrir a morta em um êxtase, como se fosse aquilo que ela desejasse…” (O Caso de Rute, p.34)

Por fim, a respeito de O caso de Rute, Dias (2019) ainda destaca:

Ademais, podemos dizer que, com muita delicadeza, Júlia Lopes de Almeida de fato retratou devidamente a condição da mulher naquela sociedade, denunciando as situações degradantes as quais as mulheres estavam submetidas. Através de personagens masculinas que ocupavam posições de destaque, como o Barão, a autora critica sutilmente a reafirmação de valor que se costuma dar a essas pessoas e os privilégios que os sujeitos do sexo masculino usufruem com sua imagem, em consonância com o silenciamento e a negativização da imagem das mulheres.(p.158)

 

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, Júlia Lopes de. O Caso de Rute. In: ALMEIDA, Júlia Lopes de. Ânsia Eterna. 2. ed. rev. Brasília: Senado Federal, 2020.   p. 27-34.

DIAS, Ana Paula Pereira. A representação do feminino no conto O caso de Rute, de Júlia Lopes de Almeida. Revista Porto das Letras, Tocantins, v. 05, n. 03, p. 147-160, 2019. Disponível em: https://sistemas.uft.edu.br/periodicos/index.php/portodasletras/article/download/8025/16014. Acesso em: 21 jan. 2024.

 

 

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