Animação como crítica social na obra de Hayao Miyazaki

17/11/2021 09:46

Mirelle Araujo Ehrardt,
Bolsista PET-Letras
Letras – Alemão

Se você é fã de animações, provavelmente, já ouviu falar do Studio Ghibli. Fundado em 1985, o estúdio de animação japonês reúne uma vasta lista de obras riquíssimas em detalhes, tanto no aspecto visual, todo feito à mão, quanto com relação ao conteúdo de suas produções. Assistir aos filmes da franquia é sempre uma experiência de adentrar mundos mágicos e fascinantes, que ultrapassam as barreiras da realidade, mas que ainda possibilitam reflexões complexas, sobre o mundo real, e críticas ao presente, provando que desenhos animados não foram feitos apenas para crianças.  Nos 36 anos de existência do estúdio, suas narrativas — que contam, em sua maioria, com protagonistas femininas fortes e corajosas, que estão dispostas a lutar pelo que acreditam, e com tramas que tematizam, principalmente, as relações da humanidade com tudo que a rodeia — marcaram a indústria de animação, além de conquistarem vários prêmios no mercado cinematográfico.


O Castelo Animado (2004)
Fonte: Imagens da Internet.*

O grande responsável pela genialidade e sucesso do estúdio é o diretor, roteirista, escritor e animador: Hayao Miyazaki, cofundador do estúdio. Nascido em janeiro de 1941 e filho de um fabricante de peças de aviões de combate, Hayao vivenciou diretamente, desde a infância, os traumas da Segunda Guerra Mundial no Japão, os quais foram marcados pela saída de sua família de sua cidade natal, em 1944, e pelo bombardeio da cidade em que se encontravam no ano seguinte. Tais experiências de vida revelam-se, posteriormente, em sua obra, as quais podem ser demonstradas pela presença constante de variadas aeronaves fantásticas e, sobretudo, pela sensibilidade das animações, do fator humanista e pacifista dos escritos.

Entre temas recorrentes está a relação humana com a natureza e com a tecnologia, no que se refere, principalmente, à destruição do meio ambiente e à valorização da natureza. Em Nausicaä do Vale do Vento, por exemplo, filme de 1984 e uma das primeiras produções do estúdio, somos apresentados a um universo em que a devastação humana promovida pela luta contra os animais, criaturas chamadas de “Ohmus”, as quais são vistas pelos humanos como monstruosas, fizeram com que as comunidades humanas fossem restringidas a limitados espaços em que ainda se podia respirar ar puro, sem a presença de máscaras, pois o resto do planeta fora tomado por gases venenosos, os quais são despejados pelos Ohmus quando ficam enfurecidos. A personagem principal, Nausicaä, é, no filme, a primeira humana a enxergar humanidade nas criaturas e a defendê-las, o que evidencia tanto o papel de protagonismo feminino, em que a mulher assume o papel de liderança (inédito para a época, em contraste com o papel desempenhado por elas em outras produções, como nos filmes de princesas da Disney), quanto a crueldade humana com relação aos animais. Outro exemplo de protagonismo feminino ligado à defesa da natureza pode ser encontrado em Princesa Mononoke (1997), em que a protagonista representa o elo de ligação entre os humanos e os deuses da floresta e luta para protegê-la da destruição causada por uma vila de mineiros fabricantes de armas.


Nausicaä do Vale do Vento (1984)
Fonte: Versatille**

Entre outros temas, podemos citar: as críticas à lógica de consumo do sistema capitalista e o desaparecimento da identidade em A Viagem de Chihiro (2001), o qual recebeu o Oscar de melhor filme de animação, em 2003; além da defesa de uma sociedade pacífica e críticas aos horrores da guerra, encontrados, por exemplo, em O Túmulo de Vagalumes (1988). Há ainda tantos outros exemplos, mas o que se destaca mesmo na obra de Miyazaki é a humanidade e sensibilidade com que temas tão complexos e necessários são trabalhados, além da beleza das animações.

Felizmente, grande parte das obras foi disponibilizada no catálogo da Netflix, o que facilitou o acesso para o público brasileiro. Não deixe de conferir!

*Descrição da Imagem: Em primeiro plano, no centro da imagem, encontra-se uma jovem, voltada para a direita, com cabelos brancos ao vento e uma blusa de manga comprida azul. Com os olhos fechados, ela beija outro personagem, um foguinho, o qual está na palma de suas mãos e também tem os olhos fechados. Ao fundo, vê-se um vale com muitas árvores e rios e, mais atrás, uma cadeia de montanhas e o céu azul-claro repleto de nuvens branquinhas.

**Descrição da Imagem 2: A personagem principal, Nausicaä, recolhe esporos de uma planta brilhante. Ela tem o cabelo ruivo e usa um capacete azul e uma máscara vermelha, que cobrem quase completamente seu rosto, veste roupas e luvas azuis. Nas mãos, ela segura um tubo para amostras.

Para saber mais:

Studio Ghibli Brasil. Disponível em: https://studioghibli.com.br/. Acesso em: 15/11/2021

 

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