Quem tem medo do racismo?

09/06/2020 18:26

Nicole da Cruz Rabello,
Bolsista PET-Letras
Letras – Inglês

Neste texto, vou lhes apresentar a obra “Pequeno Manual Antirracista” de Djamila Ribeira, mas primeiro quero lhe instigar a pensar sobre o porquê esse título — “Quem tem medo do Racismo?” — chama a atenção! A palavra Racismo é muitas vezes tratada como tabu dentro da comunidade branca, pois muitos não querem se ver como racistas. Contudo, não percebem que suas falas e atitudes contém racismo. Por isso indago, quem são essas pessoas que tem medo? Não são só os negros vítimas dessa violência, mas também os agressores brancos que não querem ter esse título associado a eles.

Fonte: Pinterest – imagem de um garoto negro como alvo *

Entretanto, por que falar de racismo em meio a uma pandemia? Ora, com a crescente veiculação midiática de casos de racismo, principalmente nas redes sociais, vemos que o  racismo no Brasil e no mundo está sendo, cada vez mais, exposto. A população se armou, não com armas, mas com câmeras para registrar as agressões e as discriminações físicas e verbais que antes passavam desapercebidas. E os agressores, por não terem sua identidade revelada, acabam por não serem responsabilizados nem sofrerem as devidas ações judiciais/jurídicas cabíveis em casos de racismo. Todavia, por que filmar e expor esses “cidadãos”? Não é apenas uma forma de expor a sua imagem ou degradá-la? Não, isso é feito para que esses atos racistas não se repitam nem passem impunes pelo sistema judiciário, e para que esses agressores não perpetuem esses atos repulsivos, abusivos e desnecessários.

Racismo e injúria racial são crimes no Brasil, mas qual a diferença entre os dois? De modo geral, injúria seria ofender a honra do indivíduo por sua raça, cor, religião ou origem; e  racismo seria uma ação discriminatória direcionada a um grupo ou coletivo específico, sendo este mais grave e inafiançável. No entanto, se fizermos uma breve pesquisa na internet perceberemos que, ainda que a população negra corresponda a 56% da população do Brasil, os casos de racismo e injúria que, de fato, vão a julgamento são poucos. E esses poucos, segundo o Laboratório de Análises Econômicas, Socias e Estatísticas (Laeser), evidenciam que 70% das ações por crime de racismo ou injúria racial no país tendem a pender em favor do réu, totalizando 66,9% dos casos vencidos pelo réu e 29,7% de casos vencidos pela vítima .

De acordo com uma pesquisa feita pela Globo News, no Rio de Janeiro, de 1988 a 2017, somente 244 processos de Racismo e Injúria Racial foram concluídos, dando uma média de 8 casos por ano. E destes processos, 40% dos casos foram considerados improcedentes pelo judiciário cível e 24% foram absolvidos na área criminal. No Tribunal de Justiça do Rio, apenas quatro casos de racismo foram julgados em 2017 e oito em 2016.  Em uma reportagem do site Geledés, os números no Tribunal de Justiça da Bahia são ainda mais baixos, de 2011 a 2018 houve apenas um processo julgado por ano.

Bom, depois de mencionar todos esses dados, quero que você reflita novamente! O sistema judiciário brasileiro é racista? Bom, já consigo imaginar sua resposta. Então vamos ao foco da minha reportagem, que tem como objetivo te ajudar a visualizar e combater os casos de racismo. Como? Sendo ANTIRRACISTA.

Vinda de uma comunidade pobre, a jovem Djamila apenas conseguiu entrar na Unifesp aos 27 anos, com uma filha, e pelo sistema de políticas de ações afirmativas, pois cota não é esmola, mas, sim, uma reparação social e histórica para com a comunidade negra. Ela é filósofa, feminista, escritora e acadêmica. Ela se tornou famosa por seu forte engajamento cyber ativista nas redes sociais. Atualmente, Djamila faz palestras pelo mundo falando sobre feminismo, raça e gênero, além de ser colunista no jornal Folha de São Paulo. Seu livro “Pequeno Manual Antirracista” foi publicado em 2019, pela Companhia das Letras.

Fonte: Google Images – foto de Djamila e sua obra **

Este livro, com linguagem simples e didática, é um guia para as pessoas pararem, refletirem e observarem os casos de racismo ao seu redor, mas não só observar, mas, sim, evitar, reagir e dialogar sobre. O Pequeno Manual Antirracista traz em seu conteúdo temas chave do dia a dia para as pessoas identificarem o porquê são racistas. Por exemplo a cultura da hipersexualização e marginalização do negro e da negra na mídia como bêbado, relaxado, gay afeminado e periférico, desdentado ou a mulata bonita de corpo esbelto e sensual.

Há também a expressão “wikipreta” onde Djamila tira o fardo de apenas as pessoas negras terem que saber tudo sobre sua cultura, etnia e história. Instigando e estimulando que o branco vista a camisa antirracista e comece também a dialogar, discutir e estudar sobre questões raciais dentro do seu grupo social e familiar, tirando essa responsabilidade da comunidade negra e dividindo-a com a comunidade branca. Um dos temas abordados é a falta de leitura de obras de autores negros e de autoras negras, dentro e fora da academia, isto é, a falta de representatividade negra desde a literatura infantil até a acadêmica e canônica.

Entretanto, vale destacar que o tema mais importante no livro, na minha opinião de leitora negra, é a abordagem feita sobre o reconhecimento por parte do branco de seus privilégios para que, através disso, ele também possa combater o racismo dentro das escolas e ambientes de trabalho. Isso nos leva a mais perguntas: quantos negros e negras você vê ocupando um cargo de diretoria ou chefia? E quantos negros e negras você observa trabalhando como copeiras/os, faxineiras/os ou garçons/etes? Faço essas indagações, pois já fui confundida, muitas vezes aqueles que estão nessas profissões, mas, por outro lado, em nenhum momento fui confundida com aqueles que ocupam cargo postos socialmente como mais importantes.

Leia, preencha-se, observe-se e mude, mas, não só você, e, sim, o ambiente ao seu redor.

Combata o racismo, seja antirracista.

*Fotodescrição da Imagem 1: A imagem é um quadro pendurado em uma parede de tijolos a vista, a arte no quadro foi feita digitalmente. Imagem de fundo laranja com um menino negro, em pé, aparecendo do joelho para cima. O menino tem uma expressão neutra. Ele veste uma camisa preta com o desenho de um alvo de tiro em branco no centro do seu peito. No meio do desenho do alvo há um ponto vermelho indicando o local central do alvo de tiro.

** Fotodescrição da Imagem 2: Imagem de fundo rosa, ao centro Djamila Ribeiro, uma mulher negra, jovem, com os cabelos trançados curtos e presos para cima. Ela usa um brinco comprido e fino de cristais na orelha direita e está com o rosto levemente virado para a esquerda. Ao lado da imagem está a foto do livro, com a capa amarela e os dizeres em preto “Djamila Ribeiro”, em cima com letras grandes, ao centro “Companhia das Letras”, em letras pequenas, e abaixo “Pequeno Manual Antirracista”, em letras grandes. Ao redor das palavras estão pequenos riscos de distintas tonalidades de tons de pele.

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