Do arrebatamento das despedidas

16/11/2022 09:41

Por Sofia Quarezemin

Letras – Português

Bolsista PET-Letras UFSC

 

Poucos dias, duas despedidas; semana difícil para os emepebeseiros.

Milton Nascimento findou sua carreira neste domingo, 13 de novembro, numa despedida icônica e sensível, agraciada por tantas vozes e tantas célebres lágrimas. A turnê A última sessão de música andou pelo Brasil, pela Europa e pelos Estados Unidos marcando 60 anos de carreira e 80 de vida. Para a tristeza dos manezinhos, não passou pela ilha. Uma obra tão vasta e relevante realmente merecia uma despedida dos palcos tão bonita, “só dos palcos mesmo, da música, jamais”, diz o artista no vídeo de divulgação da turnê.

Diante da tristeza de ver se encerrar algo tão grandioso, fica a vontade do não-fim, a esperança do mais uma vez, mais uma canção, mas a última sessão de música precisava chegar pela urgente ação do tempo, e chegou em tom de emoção. Não se pode deixar de notar o feito raríssimo que é uma turnê de encerramento. A inteligência e sensibilidade em saber o momento de parar, ou a própria certeza do trabalho concluso, fazem dessa turnê um espetáculo à parte porque se trata do artista consagrando sua própria trajetória. Não um tributo ou uma homenagem de fãs ao músico, mas o contrário: A última sessão de música é, segundo o próprio Bituca, um presente de agradecimento aos fãs, uma ponta de areia, um ponto final cuja generosidade não se mede.

Para mexer com todos os corações, não fosse suficiente o teor saudosista da despedida, a abertura do show foi dedicada à Gal Costa. A cantora baiana findou em 9 de novembro (por curiosidade, dividindo data de falecimento com Cecília Meireles). Esse encerramento, que não a permitiu encontrar seu momento de parar, é tão curioso que a fez ganhar um show todinho em seu nome. Uma homenagem de um amigo sincero que amava tanto a força estranha de sua voz e que emocionou a todos cantando aquelas duas horas e meia que eram de encontro e também de despedida.

Imagem: Gal e Milton

FonteBlog do Cardosinho (2022)

Descrição de imagem: Trata-se de um retrato onde estão abraçados Gal Costa e Milton Nascimento. Ela usa uma camisa azul, cabelos volumosos e batom vermelho. Ele usa uma camiseta preta, cabelos trançados e uma boina bege. Ambos se olham e sorriem. Ao fundo, céu azul, uma estrada e montanhas.

Não me adapto à ideia do eterno, mas definitivamente há vozes que não conseguem acabar, porque quem morre de noite nunca mais acorda e quem morre de manhã nunca mais dorme. Quem morre de coração não sabe, mas o peito arde e se abre. Quem morre de dor sabe que só pode aprender uma lição que não vai servir de nada quando se encerrar a travessia. Há vozes que não conseguem acabar. Da notícia repentina da morte de Gal, fica a imensa vontade de gritar seu nome Gal. O nome Gal mais alto, feito de forças estranhas entre flores e estrelas. Uma voz Gal, um corpo tropical, um grito qualquer, uma cólera fa-tal. Essa constante agonia elétrica e bastante brasileira carrega o nome Gal. O imaginário festivo, São João e Carnaval, carregam a voz Gal.

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