De onde vem a linguagem?
Por Anna Letícia de Abreu – Bolsista PET-LETRAS
Gabrieli Marques – Voluntária PET-LETRAS
Isabela Milioli – Autora convidada
Maysa Monteiro – Bolsista PET-LETRAS
Você já parou para pensar de onde vem a linguagem? Por que nós, seres humanos, desde muito cedo possuímos a capacidade de nos comunicar e entender o código linguístico mesmo antes de termos feito uma aula de gramática? Mais do que decorar regras, o que nos faz ter a predisposição de adquirir esse sistema? Por exemplo, como uma criança, até os quatro anos de idade, já é capaz de dominar esse jogo linguístico? A aquisição da linguagem é um processo tão automático que quase não percebemos o quanto ele é complexo. Muitos estudiosos se dedicaram a investigar sobre o assunto, trazendo debates, teorias e descobertas que nos ajudam a responder essa pergunta: de onde vem a linguagem?
Para refletir sobre algumas questões que giram em torno da aquisição e da linguagem, nós, graduandas de Letras – Língua Portuguesa e Literaturas, sendo acompanhadas pela Profª Dra. Cristiane Volcão, da disciplina de Aquisição da Linguagem, criamos como método de divulgação científica uma série especial do #ComunicaPET, que chamaremos por #ComunicaLinguagem. Serão três edições sobre temas de interesse da disciplina, contando com posts de Instagram, texto publicado no site e ainda podcast! Acessível para aqueles que tem curiosidades sobre aquisição e suas várias possibilidades!
De início, é importante diferenciar linguagem e língua. A linguagem é a capacidade que o ser humano tem de se comunicar e usar símbolos para representar o mundo, e a língua é o sistema específico que usamos para fazer isso – como o Português, o Inglês, a Libras e outras muitas opções. Tendo esses dois conceitos em mente, veremos algumas teorias que tentam explicar nosso questionamento, debatendo de onde vem a linguagem.
Na Teoria Behaviorista ou Comportamentalista, por muito tempo acreditou-se que a linguagem era aprendida como qualquer outro comportamento e que as crianças aprendiam por imitação, repetição e recompensa. Frederic Skinner, um de seus teóricos, afirmava que a criança aprende a falar vendo os adultos e os imitando, recebendo respostas positivas quando acerta e negativas quando erra. Parece fazer sentido prestarmos atenção naquilo que as crianças realmente dizem, pois elas têm uma capacidade de produzir sentenças que nunca ouviram antes, como “eu fazi” ou “eu não sabo”. Nesses casos, ainda cometendo “erros”, a criança está entendendo e aplicando as regras de sua língua, mesmo sem nunca ter escutado essas frases antes. Se a aquisição fosse apenas por meio de imitação, de onde viriam essas “invenções”?
Já na Teoria Gerativista, acredita-se que a linguagem não é apenas aprendida, ela é inata, ou seja, pertence ao indivíduo desde o seu nascimento. Essa teoria revolucionou as discussões sobre o assunto e foi defendida por Noam Chomsky. Para esse linguista, já nascemos com uma espécie de “kit básico”, que nos prepara para adquirir qualquer língua, ele chama isso de Gramática Universal. Isso explicaria porque bebês do mundo todo passam por estágios muito semelhantes em relação ao desenvolvimento linguístico mesmo falando idiomas completamente diferentes. Para ele, o ambiente da criança é importante, mas apenas ativa um conhecimento que já está ali no cérebro. Ou seja, não aprendemos o código linguístico apenas porque imitamos falas ou sinalizações de outras pessoas, e sim porque já estamos programados para isso.
Ao longo das últimas décadas, além dessas teorias que citamos, muitas outras foram trazidas para o debate: o Cognitivismo, teoria defendida por Piaget, que diz que a linguagem está vinculada ao desenvolvimento cognitivo geral dos seres humanos e que o conhecimento se constrói através de estágios de desenvolvimentos; o Interacionismo, defendido por Vygotsky, que destaca o papel das interações sociais para o desenvolvimento da linguagem.
Então, afinal, de onde vem a linguagem? Os debates sobre o assunto seguem abertos, até porque nenhuma das teorias dá conta de explicar tudo, entretanto, o gerativismo, com sua proposta de que nascemos biologicamente preparados para adquirir a linguagem, é hoje uma das teorias mais influentes e amplamente aceita. Isso não significa que as outras estejam descartadas, pois elas também oferecem explicações e complementações valiosas.
Por fim, o que nos impressiona é saber que a linguagem, algo que usamos sem pensar, passa por processos mentais e universais, e entender mais sobre isso é entender mais sobre nós mesmos. Agora quando você ouvir uma criança pronunciando “eu não sabo”, vai entender que isso é um sinal de que a mente daquela criança está criando, testando e ajustando hipóteses sobre o funcionamento de sua língua, e isso é incrível.
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
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